Osteria delle tre panche

Depois de um bem sucedido restaurante na menos turística via Pacinoti, e de uma passagem por New York para um pop up, Andrea e Vieri, os dois apaixonados por trás da Osteria delle tre panche, decidiram que era hora de abrir um segundo restaurante.

Para isso nada melhor que o centro histórico de Florença, mais ainda quando a localização é um 5ºpiso em cima da Ponte Vecchio e com vista para o Duomo. A qualidade da comida já tinham garantido no seu primeiro espaço, agora estava também garantida a localização e o ambiente.

A vista da nossa mesa

O restaurante ocupa um piso e o rooftop do clássico hotel Hermitage, dispondo de uma sala clássica, dominada pela madeira e o feeling de um velho club inglês, repleto de patine e identidade. Mas o seu segredo é mesmo o rooftop, com uma vista de quase 360º num ambiente intimista e informal, onde tivemos a felicidade de almoçar.

O Osteria delle tre Panche sempre foi reconhecido pelo seu trabalho com trufas, pelo que em plena estação da trufa branca não poderíamos deixar de seguir as sugestões com este produto tão singular.

Polenta Frita, ragù de lebre
Começamos bem, com uma polenta bem crocante no exterior mas de interior húmido, coberta com ragù de lebre, cozinhado por várias horas a fogo lento, criando nuances de sabor bem distintas de um ragù comum. É sempre uma agradável surpresa descobrir os vários “molhos” que os toscanos vão criando a partir das várias carnes de caça.

Foie gras de Chianti, tostas e mostardas
De foie apenas o nome, o que servem é mesmo o clássico pâté toscano à base de fígado de aves, aqui preparado de forma exímia. Textura e sabor irrepreensíveis, especialmente quando provado com algumas das “mostardas” que o acompanhavam.

Com este prato bebeu-se Livio Felluga Sharis, um branco de Friuli que combina elegância e complexidade através do blend de Chardonnay com a casta nativa Ribolla Gialla. Um vinho que acompanhou particularmente bem o prato de fígado.

Tagliolini e Trufa Branca
Num restaurante reconhecido pelas suas propostas à base de trufa e estando nós em pleno pico da trufa branca, não poderíamos deixar de abraçar esses mesmos pratos. Começamos com um tagliolini bem preparado com manteiga e, claro, o inolvidável aroma da Trufa que nos estimula todos os sentidos.  Foi o prato perfeito para uma primeira refeição em Itália!

A harmonizar esteve um Girolamo de Castelo di Bossi, um 100% merlot cujo estágio prolongado lhe deu nuances e delicadeza capazes de acompanhar o prato.

Tártaro de Vaca, gema de ovo e trufa branca
Um clássico ao estilo italiano, em que a carne leva menos complementos que na versão francesa, mas onde se destaca obviamente o sabor da carne e o aroma sempre espetacular da trufa. Um pouco mais de sal e teria subido uns patamares de sabor.

Ao copo chegou um mais robusto Corbaia, também ele do produtor Castello di Bossi, aqui sim com um blend mais tradicional de Sangiovese e Cabernet Sauvignon. Um Super Toscano de corpo firme e equilibrado cujas notas de fruta vermelha madura e a acidez funcionaram bem com o prato.

Não deixamos espaço para a sobremesa, mas reza a lenda que o seu cheesecake é apreciado e louvado além fronteiras.

O serviço decorreu de forma diligente, com simplicidade mas sempre assertivo, principalmente no acompanhamento e serviço feito pela sua sommelier.

Considerações Finais
A Osteria delle tre panche é já um clássico bem instituído da cidade, visitado por locais e turistas em busca dos autênticos sabores toscanos. O espaço no centro histórico combina uma localização idílica com uma decoração sóbria e intemporal que servirá todos os gostos sem qualquer problema, especialmente aqueles que, como nós, tenham o privilégio de ficarem voltados para a obra-prima de Brunelleschi. Se procuram um restaurante tipicamente Florentino, e se em particular têm interesse em descobrir e provar pratos à base de trufa, então este poderá ser um espaço para vocês. Nós voltávamos hoje!

 

Preços a partir de 45€ (sem vinhos)
Roof Hotel Hermitage | Vicolo Marzio, 1 – Florença

Fotos: Flavors & Senses
Textos: João Oliveira
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Hotel Arts Barcelona

Na nossa última viagem a Barcelona escolhemos aquele que viria a transformar-se num dos nossos hotéis favoritos na cidade – o Hotel Arts Barcelona.

A caminhada em direção ao hotel é, por si só, uma experiência marcada pelo deslumbramento. O seu imponente exterior de aço e vidro destaca-se no horizonte da cidade, proporcionando uma visão única. O hotel tem uma conjugação perfeita – é um hotel de praia luxuoso e ao mesmo tempo consegue ser um destino sofisticado no centro da cidade.

Construído a partir de 1991 para os Jogos Olímpicos de ’92, o Hotel Arts Barcelona tornou-se famoso pela sua arquitetura única, que redefiniu completamente a paisagem ao seu redor. É uma combinação perfeita de design contemporâneo e luxo tradicional, com 44 andares projetados pelo renomado estúdio de arquitetura Skidmore Owings Merrill, sob a direção deBruce Graham.

O edifico só começo a funcionar como Hotel Arts Barcelona sob a sigla Ritz-Carlton a partir de 1994, e desde aí faz verdadeiramente jus ao nome, o hotel é verdadeiramente uma galeria de arte por si só! Destaca-se a icónica escultura aquática El Peix, projetada por Frank Gehry, uma das mais notáveis entre as mais de 500 peças de arte distribuídas pelo hotel, tendo inclusive colaborações com galerias de arte que usam peças contemporâneas especialmente selecionadas só para o espaço.

Esta foi a nossa primeira viagem com a Francisca, tinha ela 7 meses. Não posso dizer que a escolha do hotel tenha recaído sobre esse facto, mas a verdade é que a localização e o conforto do hotel melhoraram significativamente a experiência de viajar com uma bebé tão pequena e exigente.

Quartos
Com quartos a proporcionar vistas deslumbrantes sobre a cidade e o Mediterrâneo, a nossa Suite Executiva não foi excepção. Decorada com um design mais neutro, que vai ao encontro do padrão habitual dos hotéis com cunho Ritz-Carlton, com móveis discretos, uma cama grande e uma decoração simples mas bastante elegante

Restaurantes
Outro dos hightlights do Arts Barcelona é a panóplia de restaurantes e bares.

Contam-se sete restaurantes e bares dentro do Arts Barcelona, formando uma experiência culinária diversificada, desde cocktails no cosmopolita P41 Bar & Coctelarium até ao prestigiado Enoteca Paco Pérez, com duas estrelas Michelin.

Uma cuidada e ampla seleção de pequeno almoço

Uma cuidada e ampla seleção de pequeno almoço

Pelo meio temos o aclamado Roka, de cozinha japonesa, aberto apenas no verão, o Marina Coastal Food de cozinha mediterrânea, o The Pantry com o seu ambiente mais intimista para um fim de tarde ou jantar mais leve, o Bites, o local ideal para um snack ao longo do dia, um vinho a meia da tarde ou apenas uma reunião de trabalho e o Lokal que nos presenteia com a primeira refeição do dia.

Serviços
Aqui devemos ressalvar uma versatilidade notável, sendo um dos elementos chave do Arts Barcelona – o 43 The Spa. Uma espécie de refúgio que quase nos permite tocar as nuvens.

Uma espécie de duplex situado no topo do hotel com várias zonas de relaxamento, salas de massagem, turco, piscina e sauna com, provavelmente, uma das melhores vistas do mundo!

Um único senão que não compreendo – o spa não tem acesso gratuito a hóspedes. E não falo de realizar algum tipo de terapia, que obviamente teria que ser paga, falo de usufruir apenas das instalações e do circuito de água. Compreendo a necessidade de marcação, para garantir uma maior privacidade e momento de ócio, não consigo compreender o facto de hóspedes terem que pagar para usufruir das instalações.

Voltando aos serviços do Arts Barcelona. Além dos belos jardins onde nos podemos perder, o hotel conta com duas piscinas, uma exterior mais orientada para famílias e uma piscina infinita apenas para adultos, excelente regra, que permite a quem viaja sem crianças usufruir de momentos de relaxamento.

No que a áreas de bem-estar diz respeito, o hotel conta ainda com ginásio perfeitamente completo para o mais exigente dos atletas.

Para quem viaja a trabalho e decide ficar num dos melhores hotéis da cidade, saiba que o Arts Barcelona conta com 14 salas para eventos como conferências, reuniões ou palestras, assim como um salão de festas que consegue acomodar mais de 1000 convidados.

De salientar que cada sala pode ser perfeitamente personalizável de acordo com o evento em si.

Para quem usa a exclusividade como mote das suas viagens, o hotel tem o Club Floor e o Executive Club Lounge, uma espécie de item básico habitual do Ritz-Carlton. Um pequeno paraíso para os hóspedes Premium, com check-in privativo e refeições gratuitas ao longo do dia.

Uma primeira viagem fantástica com a “fera”

Concluindo, eu diria que o Hotel Arts Barcelona tem a simbiose perfeita entre o mar, a cidade e a arte. E que volvidos 30 anos, não só acompanhou as mudanças, como soube reinventar-se para se manter como um dos mais imperdíveis hotéis da cidade.

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Mont Bar

 

Será este o momento da democratização das estrelas Michelin? Podemos ir a um espaço estrelado e beber um copo de vinho e comer um prato ou alguns snacks? Poderá um bar receber uma estrela? Foi certamente isso que passou pela cabeça de Ivan Castro, o proprietário do Mont Bar quando receberam o convite para a gala de 2023. E sim, um pequeno wine bar de esquina em Barcelona ganhou a sua 1ª estrela!

Mas voltemos mais atrás para perceber o fenómeno! Há cerca de 10 anos Ivan, depois de um percurso familiar ligado à hotelaria, decide abrir um pequeno bar, decorado com bom gosto , numa combinação de Bistrot elegante e wine bar, que servi-se tapas diferenciadas dos demais. O sucesso foi grande, a esquina da Carrer de la Diputació com Aribau tornou-se pequena e quis o destino que na porta ao lado, Ivan e a sua esposa abrissem o – ainda mais informal – Mediamanga. No entanto e ao contrário de tantas histórias que todos conhecemos, a malograda pandemia trouxe ao Mont Bar a cereja no topo do bolo. Com o encerramento de todo o projecto el Barri de Albert Adrià, Fran Agudo – até então chef do Tickets juntou-se a Ivan e Kasaundra para reformular e inovar ainda mais o que se fazia por ali.

A ideia sempre foi a de criar um espaço informal, com uma cozinha séria, de produto e com muitas nuances de vanguarda, onde sobressaíssem os snacks e os pequenos pratos de partilha, e foi isso mesmo que nos levou até lá para um almoço ligeiro antes de um voo de regresso a casa.

Começamos com um Albariño escolhido entre as mais de 250 referências do espaço, e um amuse bouche à base de salsa e cogumelos que deixava antever que a cozinha de vanguarda seria o mote dos snacks que se seguiriam. Com isto rapidamente percebemos que também no serviço começaram logo por mostrar que não estávamos num qualquer bar de esquina catalão, considerando o rigor e o conhecimento que demonstravam e nos levava para outros ambientes.

Amuse bouche – Salsa e Cogumelos

Soufflé de Berbigão
A quase já clássica Air Baguette de Adrià recheada com espuma de hondashi, endro e berbigões de alta qualidade abertos no ponto. Um delicioso contraste de texturas e sabor a mar com nuances de frescura.

Um início ímpar ao que se seguiu um Tártaro de Wagyu com pão de chipotle, onde se destaca a textura untuosidade da carne bem contrastante com a base arejada, crocante e levemente picante do chipotle.  Lula, Pele de frango 
Se até aqui o nível ia bom, aqui subiu a outro patamar – o molusco com uma textura sedosa e suave como se encontra apenas nos melhores espaço de sushi, em contraste com a pele crocante e bem seca levam-nos num jogo sabor e textura único. Um grande, grande snack!

Bikini de camarão e pézinhos de porco
No momento seguinte a cozinha de vanguarda dá as mãos à cozinha de conforto dos bares que aqui homenageiam. Porco e camarão – um casamento famoso na cozinha asiática, que aqui ganha forma como uma fina sanduíche de recheio gelatinoso e exterior crocante com os pequenos camarões a ficarem bem tostados. Para comer em dose dupla!

Ventresca de Atum, molho de pinhão
Entrando nos “pratos principais” a irresistível ventresca de atum marinada em teriyaki com molho de pinhões e notas levemente fumadas, a acompanhar fatias de bom pão. Produto de ótima qualidade, trabalhado com precisão e respeito, num prato que não apetece parar de comer.  Canelone de Frango, cantarelos e. foie gras
O prato mais conservador é também ele o mais profundo em sabor, com notas de outono bem casadas e técnicas que são tudo menos simples. A começar logo pela massa fresca, o frango ainda húmido e suculento, o molho rico de foie gras e o ótimo demi-glace. De limpar a última mancha com a côdea do pão!

Twister de Lavanda
Finalizamos com um regresso à infância e aos gelados da Olá (ou neste caso da Frigo) numa versão de alta cozinha, levemente aromatizado com lavanda, boa textura e sabor delicado, perfeito para um final leve como se pretendia.

Houve ainda tempo para uns petit fours preparados com elegância e savoir fair

Nos vinhos optamos por seguir toda a refeição com Albariño de 2020 1583 de Fefiñanes de aromas expressivos com algumas notas especiadas e fruta de caroço, com a boca a revelar uma ótima frescura e uma estrutura capaz, fruto do seu curto estágio em madeira.

Como referi anteriormente o serviço decorreu de forma irrepreensível, deixando antever que o sonho de democratizar a alta gastronomia há muito que fazia parte das intenções de Ivan. Certo que hoje, depois da estrela, os preços aumentaram ligeiramente e o menu de degustação surgiu quase por obrigação, mas continua a ser possível escolher à carta, e deixar-se levar por alguns snacks ou um, ou outro, prato bem hidratados com vinho a copo como na génese do restaurante.

Considerações Finais
Este pode muito bem ser o restaurante de fine dining para pessoas que odeiam fine dining. Do ambiente relaxado de bistrot à cozinha de produto, técnica mas irrepreensível. Aqui não encontramos a imposição de um chef ou a rigidez institucional da maioria dos restaurantes do segmento, é aquele restaurante elegante que poderia muito bem ser o bar de todos os dias, onde podemos divagar entre mesa, balcão ou o bulício da esplanada se estivermos nesse mood, a carteira é que claro irá sofrer as consequências de uma cozinha e um serviço de primeira linha.

Se voltaria? Já amanhã e de preferência sem um avião para apanhar de forma a poder mergulhar a fundo em todo o seu menu.

Mont Bar – Barcelona
Preços a partir de 60€ (sem vinhos)
Carrer de la Diputació, 220  – Barcelona

English Version

Fotos: Flavors & Senses

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Estimar Barcelona

Estimar, valorizar e respeitar, pode muito bem ser o mote de qualquer restaurante de produto – daqueles que realmente se focam no produto e não aqueles que apenas gostam de o anunciar, normalmente repletos de desfaçatez… Adiante!

Entre esses templos do produto, é ainda mais raro ver a assinatura de um chef entrelaçar-se com essa cozinha desnuda, sem adereços e focada em sobressair o melhor de cada ingrediente, como no caso do Estimar e de Rafa Zafra. Aberto em 2016 em Barcelona, numa localização que teria provavelmente tudo para dar errado, Rafa levou o seu extenso currículo (entre passagens pelos melhores restaurantes de Espanha e Itália, o chef sevilhano estará para sempre ligado aos irmãos Adrià, com os quais chefiou a Hacienda Benazuza no El Bulli Hotel e o Heart em Ibiza) para uma cozinha 100% focada no mar.

Com ingredientes únicos em mãos, fruto da ligação à família Gotanegra que há 5 gerações comercializa peixe e marisco no porto de Roses, a assinatura de Rafa passou sobretudo por combinações ousadas que despertam nos comensais uma avidez e um desejo difícil de explicar  – basta lembrar o seu célebre ouriço com gamba e caviar.

Entrando no restaurante entramos num pequeno mundo à parte, ambiente totalmente informal, mesas despidas e quase sobrepostas, com a sala a ser simultaneamente balcão e cozinha, permitindo-nos entrar num espetáculo bem montado de cozinha e serviço.

Na mesa somos rapidamente brindados com o couvert, Biqueirão marginado, azeitonas bom pão e champagne no copo.

couvert

A Gilda 3.0 do Estimar é uma elevação do clássico basco, acompanhada do pão com tomate bem catalão. Anchova, percebe, guindilla, alho, pimento e azeitona, num pequeno espeto repleto de dimensões e nuances de sabor, que nos mostram logo à partida que não estamos numa qualquer marisqueira.

Seguiu-se uma das assinaturas de Rafa, uma torrada, com manteiga fumada e um dos seus fetiches, caviar, diz-se aliás que será por ventura o chef a vender mais caviar em todo o mundo, muito por culpa do seu Jondal em Ibiza.  Deliciosas notas de fumo e gordura refrescadas por um mergulho no mar. Podia facilmente comer uma dúzia.. ou duas!

Continuamos com mais um mergulho salino com umas ostras francesas de porte singular, servidas com pompa e circunstância, finalizadas com um toque de chalota em mignonette.

Ouriço, Gamba e Caviar
Este prato é uma das mais singulares assinaturas de Rafa Zafra, e um dos motivos da nossa visita, pelo que felizmente estava disponível. Para quem gosta de sabores marinhos e naturais é impossível resistir a esta bomba de mar, textura e equilíbrio de salinidade e doçura. Facilmente a minha última refeição!

Anémona-do-mar
Aqui vemos mais uma vez a técnica ao serviço de um produto raro e pouco valorizado (pelo menos entre nós). Aqui as anémonas foram fritas de forma irrepreensível, criando pontas crocantes e um interior repleto de sabor e rugosidade.

Lagostim
Um lagostim de mais de 500gr, ligeiramente cozinhado no josper apenas até ao seu corpo deixar de ser completamente translúcido. Jugoso, doce e único, numa homenagem superior ao produto que nos foi colocado à frente. Para os portugueses seria claramente um lagostim cru, mas a verdade é que precisamos mesmo de mudar a forma como apreciamos produtos tão nobres e com tanto para nos entregar.

Gamba Roja de Roses
O Marisco que Rafa utiliza e homenageia com mais frequência são estas gambas rojas de Roses. Poderiam ser de qualquer outro porto, Dénia, Huelva, Palamós, Garrucha… que o dito cujo não tem fronteiras. A diferença está sobretudo nos barcos e na forma como são tratados e cuidados desde o momento da pesca até ao momento da entrega final. Quanto ao sabor não há muito a dizer, é o meu crustáceo favorito, de corpo doce e uma intensidade de sabor na cabeça à qual é difícil resistir. Aqui foram ligeiramente cozinhadas no josper e servidas de imediato.

Rodovalho
Não entrando na habitual guerra de rodovalho/pregado que tanto vivemos no nosso país, aqui comemos rodovalho, ao que os nossos vizinhos chamam de rémol. O peixe a que chamam rodaballo é na realidade o nosso pregado. Um peixe de pequeno porte, perfeito para dois comensais depois de uma já longa refeição. Grelhado rigorosamente no Josper, espinhado e regado com uma salsa bilbaina, mais rica do que a normalmente encontramos pelo país basco.

A acompanhar estava uma singular salada de tomate, com diferentes variedades e que facilmente conquista os mais cépticos.

Tarte de Queijo, marmelada de morango
As sobremesas são outro dos capítulos importantes do Estimar, criadas por Francisco Zafra, irmão do chef e atual chef executivo do Estimar Barcelona. Infelizmente não havia capacidade para mais, pelo que escolhemos apenas uma (todas têm um tamanho considerável, pelo que dão bem para 2 pessoas) e, assim sendo, a escolha acaba sempre numa tarte de queijo, quando há. Cremosa como ditam as tendências mas de sabor mais cítrico e fresco que o habitual. Um belíssimo final!

O serviço decorreu de forma diligente e a bom tempo, especialmente cuidando que havia uma pequena criança entre nós. Nota alta para as explicações de cada produto e as sugestões da carta, enquanto no copo nunca faltou o Bollinger, marcado a um preço correto e que envergonharia qualquer restaurante português.

Considerações Finais
Passar as portas de vigias do Estimar é entrar num mundo especial desenhado Rafa, Anna e Ricardo.Um mundo de sabor, serviço, informalidade, respeito e paixão, muito respeito e paixão, por produtos únicos, criteriosamente selecionados e cuja qualidade é cada vez mais difícil de encontrar pelos comuns mortais. Uma cozinha sem a “ficção científica” que seria o meio mais simples para Rafa Zafra se movimentar, mas sim despida de tudo menos de sabor e precisão técnica. Uma refeição inesquecível para qualquer amante dos sabores do mar, repleta de momentos altos e finalizada da melhor forma.

Só me resta contar os dias para voltar. Este Estimar é claramente um dos imperdíveis!

Estimar – Barcelona
Preços a partir de 100€ (sem vinhos)
Carrer de Sant Antoni dels Sombrerers, 3 – Barcelona

English Version

Fotos: Flavors & Senses

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The Lodge – Wine & Business Hotel

Inserido numa das zonas mais históricas da cidade do Porto, ou melhor dizendo, de Vila Nova de Gaia, está o intemporal The Lodge Wine & Bussiness Hotel.
Com o cunho exclusivo de Nini Andrade Silva, em cada recanto do hotel é bem visível a alma do Douro, assim como a assinatura da designer, as suas linhas curvas, tons e materiais.

A sua localização nas nobres e centenárias caves de vinho do Porto adiciona história ao seu encanto moderno com cada detalhe a ressoar com a cultura do vinho, prestando, assim, homenagem à identidade da região vinícola do Douro.

Primeira Impressão
Inaugurado em 2020, o The Lodge tem origem numas antigas caves do Vinho do Porto.
A autenticidade arquitectónica do edifício foi cuidadosamente preservada na sua estrutura, mantendo o espírito e alma do douro e da cidade.

Ao entrar no hotel, somos recebidos por um design contemporâneo e moderno que nos deixa uma impressão de arrojo, mas que é, simultaneamente, discreto. Tons terrosos da paisagem do Douro e os azuis do rio dominam o interior do hotel.

O The Lodge foi a nossa primeira escolha para uma escapadela após o nascimento da nossa filha, Maria Francisca, e a experiência não poderia ter sido melhor.

Como vivemos próximo ao hotel aproveitamos para passar o dia em sossego, que é como quem diz, a fera de 4 meses ficou com a avó, sob a premissa de a irmos buscar ao fim da tarde e trazê-la para o hotel para a sua primeira experiência fora de casa!
O hotel foi informado deste detalhe com antecedência e tinham tudo preparado para ela à nossa chegada.

Fomos recebidos por uma simpática equipa de receção que prontamente tratou do nosso check-in e nos encaminhou ao teste rápido Covid-19 (sim, no verão de 2021, o vírus ainda era uma preocupação). Com a ajuda dum sorridente membro da equipa que nos foi contando como as coisas estavam a voltar à normalidade na hotelaria, fizemos o teste e voltamos à receção para conhecer o carismático Niklas – Marketing & Sales Director – que nos contou e mostrou um pouca da história do The Lodge.

Quartos
O The Lodge dispõe de um total de 119 quartos distribuídos por 7 pisos, oferecendo uma variedade de tipos de quartos: Suite Signature, Suite, Suite Júnior, Quarto Superior, Quarto Deluxe e Quarto Terrace Deluxe.
Ficamos num Quarto Deluxe cujo design moderno e cores quentes transmitiam uma sensação de conforto e elegância.

As vistas privilegiadas sobre o rio Douro e a cidade do Porto acrescentaram charme à nossa estadia e fizeram as honras do momento.
No berço da Francisca encontramos um gesto de boas-vindas em forma de produtos da Occitane para bebé. À nossa espera estavam também doces, fruta e vinho – a forma correta de receber os hóspedes (ainda que estranhamente o vinho fosse do Dão)!

No The Lodge, nenhum detalhe é deixado ao acaso, o conforto da cama, a tapeçaria que reflete nos diversos espelhos e dá a sensação de brilho em cada recanto, a vista e a luz da cidade que premeiam cada centímetro do quarto, culminando no conforto do cadeirão que permite um bom momento de ócio.

Restaurantes
O hotel possui dois espaços distintos para refeições: o The Lodge Bar e o seu ex-libris, o restaurante Dona Maria. O The Lodge Bar destaca-se como um espaço central no hotel, exibindo luxo e sofisticação na decoração e uma extensa seleção de vinhos e bebidas espirituosas. Desde cocktails contemporâneos até clássicos, é a escolha ideal para uma noite relaxante. Aqui, pode também desfrutar de um completo e saboroso Afternoon Tea.

 Já o Dona Maria é um tributo às “Donas Marias”, as habilidosas cozinheiras que fizeram a história da gastronomia portuguesa!
O mote passa por resgatar as melhores receitas tradicionais do Porto e do Norte do país.

O Dona Maria apresenta um maravilhoso teto ornamentado por gigantes folhas de videira e uma sinuosa garrafeira que envolve todo o espaço. Mármore, veludo e madeira conjugam-se na perfeição, estendendo a área de refeições para um terraço convidativo com vistas magníficas sobre o Porto.


Aqui tivemos a oportunidade de jantar num ambiente calmo, perfeito para a curta idade da Fera que ainda aproveitou o tempo para uma sesta, de beleza e reparação para ela, de sossego para nós! Partilhamos bons croquetes, Xerém de amêijoas, e uma versão modernizada da canja, antes de um irrepreensível bacalhau com grau e uma chanfana desossada. Tudo correto, sem altos e baixos que perdurem na memória.

Junto à piscina do hotel, os hóspedes podem, também, desfrutar de várias bebidas e snacks ao longo do dia.

Serviços
Por falar em piscina – esta está inserida num espaço que se assemelha a um verdadeiro oásis no meio do bulício da cidade!
Com água aquecida, espreguiçadeiras confortáveis e sofás mais reservados, proporcionou o cenário perfeito para a nossa tarde enquanto saboreávamos um bom espumante português.

Junto à piscina há também um pequeno ginásio para quem, ao contrário de nós, gosta de manter os seus treinos durante as férias.

O hotel não possui, no entanto, um spa, mas para quem quiser usufruir dum momento de relaxamento, tem sempre a hipótese pedir um In-Room Spa, quer para serviços de massagem, de estética ou até mesmo de cabeleireiro.

Para quem é amante de vinho o The Lodge disponibiliza Provas e Experiências Vínicas acompanhado de petiscos tradicionais da gastronomia portuguesa.
O hotel possui até uma Academia de Vinhos liderada por uma equipa de Sommeliers, oferecendo assim diversos cursos de formação para iniciantes.


Uma das atividades mais agradáveis que podem ser  realizadas é um passeio magnífico de barco ou iate no Rio Douro, organizado pela equipa do hotel.

Além desta, há uma infindade de atividades fora do hotel mas devidamente organizadas pela equipa – como explorar a cidade ou até mesmo as regiões vínicas do país, visitar uma das Quintas parceiras do hotel e até ficar lá hospedado, e participar das vindimas se for época disso.

As deslumbrantes vistas sobre o Douro
Para quem viaja em trabalho o The Lodge é também um hotel a ter em conta, ou não fosse ele um Bussiness Hotel, dispondo por isso de várias salas com distintas capacidades que podem ser usadas quer para eventos corporativos quer para eventos sociais.

Pequeno-almoço no quarto

Atendimento
É sabido que os recursos humanos no setor do turismo e da gastronomia podem ser escassos, e as oportunidades de formação são limitadas ou sem o padrão que se gostaria.No entanto, a nossa experiência no The Lodge foi uma agradável surpresa.


Uma equipa jovem, dinâmica, atenta e extremamente simpática. A atenção e o cuidado constante com a Francisca conquistou-me completamente.

Uma estadia a repetir sempre que quisermos fugir do bulício da vida mas sem ir para muito longe!

Até breve The Lodge Wine & Bussiness Hotel!

The Lodge – Wine & Business Hotel
Quartos a partir de 175€ 
Rua de Serpa Pinto 60, 4400-307 Vila Nova de Gaia

English Version

Fotos: Flavors & Senses

 

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“Pedro Lemos há só um”

“Pedro Lemos há só um” poderia muito bem ser o título do texto que se segue, é verdade que o poderíamos dizer sobre muitos chefs de cozinha, mas nem tanto quando olhamos para o panorama nacional. Acompanho o trabalho de Pedro Lemos há muitos anos, muito por culpa da ousadia de ter dado o seu nome ao seu primeiro restaurante a solo, numa altura em que o fine dining era uma miragem na cidade do Porto. Pedro trouxe muito mais do que “Petiscos, vinhos e guloseimas”, conseguiu reunir toda a cidade – incluindo aquela que procurava uma restauração mais cosmopolita e trendy – à sua volta, das suas propostas arriscadas e dos seus sabores profundos.

Mudanças, lutas, altos e baixos e muita perseverança trouxeram a primeira estrela Michelin e, com ela, a estabilidade e a clientela internacional mais informada (pecou por demorada como é apanágio de nuestros hermanos), novas aventuras, novos restaurantes, empratamentos mais arrojados e até uma inovação recente na sua cozinha, os pequenos amuse bouche.

E foi com esses mesmos que depois de um pequeno compasso de espera começamos a refeição acompanhados de Murganheira Grande Reserva 2005, de notável elegância e notas de estágio complexas que o posicionam entre os bons espumantes nacionais.

 Os amuse bouche

Começamos então com bao de sapateira, blini de bacalhau, tartelete de pato fumado e nori e macaron de cogumelos e ovo de codorniz , todos eles esteticamente irrepreensíveis, mas com nenhum a revelar-se inesquecível, com pequenas falhas na composição fazendo com que alguns dos sabores ou texturas se perdessem.

Cavala, Alface e gengibre
Aqui o caso muda completamente de figura permitindo-nos entrar verdadeiramente em pleno na cozinha de Pedro Lemos, cada vez mais refinada e influenciada pela cozinha asiática – recordo bem um prato de atum e wasabi, onde tive provavelmente a primeira noção dessa influência – as notas frescas conjugadas com a gordura e riqueza do peixe azul fizeram deste um excelente primeiro momento.

Nota alta para o inesperado cocktail com que harmonizamos o prato à base de Porto branco, gin, mezcal e cordial de shiso que funcionou em pleno com o prato, e que servido um pouco mais gelado poderia estar em qualquer bar de palmarés internacional.

Foie gras de pato, marmelo e brioche
Este é o momento “podia comer isto durante toda a minha vida” dos menus de Pedro Lemos, um prato que o acompanha desde sempre, e que eu recordo em todas as suas versões desde o pequeno paralelepípedo com macaron, mel e pão de especiarias. Mudaram-se as formas e os acompanhamentos, apareceu o brioche acabado de cozer e nesta versão o marmelo em diferentes texturas para garantir que não falta repertório técnico. O que não muda é a mousse de foie caramelizada, repleta de sabor e de textura sedosa. Será certamente o melhor foie do país!

No copo esteve, e bem, um Barbeito Ribeiro Real Verdelho 1981, a companhia portuguesa perfeita para o foie, aqui num frasqueira de textura suave, onde os sabores de caramelo e limão e um leve fumado elevados pela deliciosa acidez se revelaram uma ótima companhia para o foie.

Enguia, kimchi, macadâmia e couves
Um prato que marca uma viragem visual e de conjugação de elementos, sabores e texturas face ao que Pedro Lemos já nos havia habituado. A enguia e o molho (delicioso) sobressaem numa grande conjugação de elementos, com notas de terra a conjugarem-se bem com sabores mais frescos e acidulados.

Gamba do Algarve, ouriço do mar e chawanmushi
Mais uma vez a cozinha francesa e japonesa ganham harmonia num prato arrebatador. Tudo irrepreensível com o chawanmushi sedoso, a gamba crua e as cabeças fritas, mas onde o destaque era, como habitualmente, o molho, minhas senhoras e meus senhores, que molho! Deviam existir frascos deste molho para trazermos para casa no final do jantar como recordação. O prato remeteu-me para um clássico de Arnaud lallement no seu Assiette Champenoise(***michelin), mas superou-o na profundidade de sabor.

A harmonizar – ou para beber – que fui eu que levei a garrafa, sem pensar ou saber o que iria comer, esteve um daqueles produtores que guardo no coração, Ramonet Saint Aubin Premier Cru “En Remilly” 2016 , o mestre de chassagne-montrachet que aqui mostra um chardonnay complexo, marcado pela boa madeira com as notas oxidativas que o caracterizam, mas ainda assim uma elegância que o permitiu flutuar bem sobre os pratos.

Tamboril, Abóbora e consomé
Mais um exemplo do novo lado estético, com mais elementos e mais detalhes técnicos e texturas, aqui com um tamboril brilhante, no seu ponto perfeito (poderia escrever um artigo sobre o sofrimento que é ver este peixe tão mal tratado nas nossas cozinhas) bem conjugado com os diferentes elementos, onde mais uma vez, o molho, ou neste caso o caldo, ganha destaque. Mais um grande prato!

Aqui arriscou-se  o vinho que trouxe para o prato seguinte, um Niepoort Charme de 2016 cuja fineza e taninos delicados permitiu um acompanhamento perfeito do peixe.

Vaca, grão de bico e molho do rancho
Olhando para a descrição do prato, dificilmente imaginaria a delicadeza e elegância que se seguiria, vaca em diferentes texturas, incluindo uma pasta próxima do tortellini, grão, emulsões e outros elementos, que resultam numa bomba de sabor que é difícil parar de comer. Uma espécie de mandamento de Pedro Lemos a dizer aos seus colegas que não é preciso wagyu nem lombo de vaca velha das montanhas para criar um prato de carne perfeito.

Ananás, moscatel e citronela
Para primeira sobremesa a frescura do ananás e da citronela casam com as notas doces, maduras e especiadas do moscatel. Um ótimo ponto de viragem no menu.

Chocolate, café e rum
Confesso que quando olhei para o menu, senti um certo saudosismo de uma possível versão 10.0 da “Banana, sagu e madeira” com que Pedro Lemos tantas vezes fechava o seu menu. Não sendo ele um apaixonado pela etapa doçeira, tivemos aqui dois exemplo de ótimo nível. Café na medida certa para potenciar o sabor do chocolate, aqui presente em diferentes e saborosas texturas. Simples e eficaz.

Finalizou-se a maridagem com Tawny Dow’s 40 anos, que não sendo a companhia mais óbvia para o chocolate, se posicionou muito bem ao lado das notas de café e rum, acrescentando-lhe as notas de frutos secos.

Realce ainda para o serviço, que apesar de um arranque lento, rapidamente se alinhou e seguiu a bom ritmo. É sempre difícil avaliar um serviço feito por pessoas novas num espaço com o qual temos algum histórico, correndo o risco de sermos injustos pela força do passado, mas aqui tudo correu com excelência e boa apresentação.Para finalizar sem grandes artifícios, uma madalena servia de petit four, mas não uma madalena qualquer, acabada de cozer, doce na medida certa e de barriga brilhante. Perfeita!

Menos positivo, apenas o pão, o elemento menos marcante e singular que marcou presença no menu e que num espaço com molhos como os que aqui se provaram merecia ser de qualidade superior à média.

Considerações Finais
Pedro Lemos apresenta o seu menu com a frase “Se eu sinto que não me adapto a este mundo, é porque nasci para criar o meu.” – poderíamos falar de ego e pretensiosismo, mas a verdade é que quem acompanha o seu trabalho (não vale a pena dizer que se acompanha sem se sentarem na sua mesa) sabe que Pedro Lemos raramente se expõe ou exibe o trabalho em redes sociais ou através de agências de comunicação. Para mim esse mundo que refere é um mundo contra corrente, mais clássico na sua génese gastronómica, mas simultaneamente uma lufada de ar fresco. Sim, pode parecer um paradoxo o que acabo de escrever, mas um menu com pratos que não consigo associar a outros “instagrams”, sem caviar, sem carabineiros nem wagyu (por mais que eu goste desses ingredientes) é sempre uma lufada de alegria que combate o tédio que muitas das vezes pode ser um menu de degustação.

Dizer que Pedro Lemos será por ventura o melhor saucier de Portugal, pode parecer redutor para muitos, mas para mim é motivo de prazer e orgulho num restaurante de onde saio sempre com a sensação que o visito poucas vezes, por isso sim, “Pedro Lemos há só um!”

Pedro Lemos
Preços a partir de 120€ (sem vinhos)
Rua do Padre Luís Cabral, 974 – Porto

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Fotos: Flavors & Senses

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Ventozelo Hotel & Quinta

Um dos últimos hotéis que experimentei antes da Francisca nascer, mas já grávida, foi o Ventozelo Hotel e Quinta.

Um autêntico refúgio em pleno Douro e com, provavelmente, uma das vistas mais idílicas sobre o rio.

Primeira impressão
O Ventozelo não é somente um Hotel, é mesmo uma Quinta que após uma cuidadosa transformação deu origem a um hotel de luxo mantendo bem presentes as tradições e histórias do douro e das suas gentes em cada recanto.

À chegada fomos recebido numa receção logo na entrada junto ao parque de estacionamento – O Douro já se fazia sentir à nossa volta e a natureza sobressaía sem pedir permissão!

Reparo apenas para quem atende a chamada ainda no parque de estacionamento e manda estacionar o carro em vez de abrir logo a cancela e mandar entrar, uma vez que após o check-in tivemos que voltar para trás para ir buscar o carro ao parque de estacionamento novamente! Não é grave, não fosse o estacionamento ser ainda um pouco distante e não estivessem 40ºC nesse dia!!!

Mas reparos à parte, fomos encaminhados ao nosso quarto enquanto observávamos o ambiente calmo à nossa volta.

Percebi imediatamente que o Ventozelo é o local perfeito para fugir do bulício habitual do dia a dia e desligar completamente. Cada recanto convida a momentos de pleno ócio!

Quartos
Contam-se 29, e distribuem-se pelos diferentes edifícios ao longo da Quinta. Cada um destes edifícios foi meticulosamente reabilitado, mantendo a traça original, mas ganhando uma nova vida com um toque de conforto envolvido numa decoração contemporânea.

Assim, distribuídos por casas ou por quartos individuais – temos a Casa do Feitor (5 quartos duplos mais um para hóspedes com mobilidade reduzida); Casa do Laranjal (5 quartos duplos); Balões (2 quartos independentes); Casa dos Cardanhos – onde ficamos – (7 quartos duplos superiores); Casa Romântica (casa com uma suite); Casa do Rio (casa com 2 quartos duplos) e Casa Grande (6 quartos duplos superiores).

Sendo que a Casa Grande tem piscina privada com uma vista privilegiada e é ideal quer para famílias quer para grupos de amigos.

Enquanto, por exemplo, a Casa Romântica é o recanto mais charmoso e ideal para uma escapadela a dois. Na realidade, acredito que todos os quartos tenham uma história para contar.

Ficamos na Casa dos Cardanhos, num dos elegantes quartos. A decoração é simples e minimalista com o conforto a ser palavra de ordem. Do quarto tem-se acesso a um jardim com uma das melhores vistas que se pode pedir – o Douro na sua plenitude.

Restaurantes
A Quinta possui uma espaço onde se fazem todas as refeições – a Cantina de Ventozelo que serve de restaurante (onde se servem todas as refeições ao longo do dia) e wine bar.

Este é o lugar onde, outrora, se serviam as refeições aos trabalhadores da Quinta. A Cantina de Ventozelo tem como mote dar vida à gastronomia local e às receitas tradicionais do Douro com assinatura do chef Miguel Castro Silva.

Os ingredientes são produzidos na própria quinta ou em produtores locais – assegurando, assim, a sustentabilidade e o impacto quase nulo a nível ecológico.

Aqui tivemos oportunidade de tomar o pequeno-almoço com a companhia dos hóspedes de quatro patas que circulam livremente pela quinta! Um pequeno-almoço simples e saboroso com pequenas falhas de timing mas que foram facilmente esquecidas com a visão do douro que se obtém do terraço da Cantina!

Apesar de gostar de pequeno-almoço à la Carte, por esta altura já sentia saudade de um bom Buffet pré-covid (felizmente já regressaram)! – Importante referir que estivemos na Quinta de Ventozelo em Julho de 2020, pelo que as medidas ainda estavam muito reforçadas pois estávamos no início da pandemia. E o Ventozelo respeitou-as na perfeição fazendo com que nos sentíssemos seguros durante toda a nossa estadia.

Também tivemos oportunidade de fazer uma prova de vinhos da Quinta e de jantar na Cantina, onde os sabores de conforto e tradição ganham um toque modesto de assinatura, onde o mais importante é não comprometer os produtos da região.

Outro local associado à gastronomia no Ventozelo é a sua pequena e amorosa mercearia.

Na Mercearia de Ventozelo podemos encontrar praticamente tudo o que provamos na Cantina ou que vamos observando na quinta. Desde vinhos, frutas, legumes, azeite e muito mais.

Serviços
Passear pela Quinta é por si só uma das melhores atividades que se pode realizar. O maravilhoso Jardim dos Aromas conquistou-me por completo e rapidamente se tornou no meu local favorito. Pena não se traduzir em palavras o aroma que se fazia sentir nesse local.

Podem começar por aqui e ir fazendo um passeio pelos jardins, visitar a pequena capela, o lagar e a adega.

A Quinta dispõe de 7 trilhos para conhecermos a fundo todos os recantos deste refúgio duriense, inclusive foi criada uma app à qual os hóspedes podem aceder no seu telemóvel de forma a serem orientados durante os seus percursos.

A Quinta tem também um Centro Interpretativo – que nos permite ficar a compreender melhor o Douro.

Situa-se num edifício do sec. XVIII onde somos convidados a interpretar o território duriense, partindo da Quinta de Ventozelo. Obviamente, e estando numa quinta no Douro, as Provas de Vinho são imperativas. Após a visita ao Centro Interpretativo nada como terminar provando o sabor de toda a história que acabou de se percorrer.

Outro dos serviços que o Ventozelo oferece é a Piscina infinita com o Douro e os seus socalcos como horizonte.

A piscina e a sua beleza e localização são inegáveis. Aquando da nossa estadia estávamos em plena pandemia pelo que as pessoas que se hospedavam nesta fase em hotéis pouco saíam deles, até porque, poucas seriam as atividades a funcionar em pleno fora do hotel nessa altura. Assim, basicamente todos os hóspedes estavam na piscina, algo que a quinta não previu. O número de espreguiçadeiras era mínimo, sendo que depois estavam espalhadas pelo jardim cadeiras que para relaxar um pouco enquanto se observa o Douro, não sendo de todo o cenário ideal.

Nota também menos positiva para o facto da zona da piscina não ter lá as toalhas, pelo que os hóspedes eram obrigados a ir à receção buscá-las caso a receção se tivesse esquecido de as entregar no momento do check in! Que foi o que nos aconteceu!

Ora bem, vejamos, a receção não era assim tão perto da piscina, estava um calor infernal, por isso a situação era de fácil resolução, o funcionário do bar da piscina contactava alguém da receção para ir à piscina levar a toalha, simples!!! Mas não aconteceu! Mas, eu compreendi, estávamos há pouco tempo em processo de pandemia, e os hotéis tinham retomado o seu trabalho, sendo que estava tudo ainda um pouco confuso.

No entanto, uma certeza paira no ar – Esta piscina tem provavelmente uma das localizações mais idílicas do mundo!

Mais espreguiçadeiras e toalhas – que acredito que agora já tenha sido resolvido – e a experiência teria sido perfeita!

Atendimento
Infelizmente esta é das maiores falhas a nível nacional, e que nas zonas mais rurais e interiores se vive ainda mais intensamente. Há falta de recursos humanos e também falta de formação profissional. O que é uma pena pois no Ventozelo a simpatia e os sorrisos estão sempre presentes.

Nota alta para o staff do restaurante que teve todos os cuidados e toda a preocupação com a minha alimentação devido à gravidez!

De salientar que a simpatia e o cuidado do staff foi constante, e se isto fosse aliado a mais pessoas com formação diferenciada teríamos equipas perfeitas, não só no Ventozelo mas também ao longo do toda a hotelaria no nosso país.


Agora prometo voltar em breve, já com a Francisca, para lhe mostrar os encantos do Douro e a beleza da Quinta de Ventozelo.

Ventozelo Hotel & Quinta 
Quartos a partir de 185€ 
Quinta de Ventozelo, Ervedosa do Douro, 5130-135 Portugal

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Fotos: Flavors & Senses

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Blind

Foi no antigo palácio da família Campos Navarro, construído em 1861, que depois de várias e distintas vidas se instalou o luxuoso Hotel Torel Palace Porto (ver) e com ele o restaurante Blind. Se o hotel presta homenagem à literatura portuguesa e aos seus autores, o restaurante, como o próprio nome deixa transparecer, remete-nos para José Saramago e a obra Ensaio Sobre a Cegueira.

O espírito inquieto e criativo por trás do projecto é Vítor Matos, o chef estrelado que aqui acumula mais um projecto de consultoria, mas onde acaba por pôr sempre a mão na massa (como aconteceu aliás na noite da nossa visita). Ao chef sempre reconhecemos uma veia artística muito forte, das pinturas à louça, famosa internacionalmente, feita em parceria com a Vista Alegre, passando pelos empratamentos sempre minuciosamente executados, mesmo antes das trends do instagram.

A proposta do Blind passa por nos levar numa viagem de sentidos, emoções, vivências e inspirações que fazem parte da vida do chef, da sua infância aos seus sonhos, passando também por chefs e detalhes criativos que em certo momento o terão marcado. Tudo isto é servido num espaço intimista, escuro e simultaneamente sedutor desenhado por Isabel Sá Nogueira – que peca apenas pela rosa pendurada sobre a mesa não ser verdadeira e não poder assim acompanhar os casais mais românticos no final da refeição como uma emotiva lembrança.

Mas deixemos a minha veia romântica e passemos ao que nos traz até aqui, a degustação do Menu Blind Emotions (o restaurante trabalha apenas com menu de degustação que poderá ser de 10 ou 12 momentos). Na mesa somos rapidamente brindados com um flute de Sidónio Sousa Bruto, engarrafado em exclusivo para os hotéis Torel, ao que se seguiram dois cocktails de assinatura da casa, Touch – vodka, limão, violeta e clara de ovo, e Sound – gin, meloa, ginger beer e clara de ovo. Amuse-bouches – tramezzino de salmão, corneto, patinhos de foie e espresso martini

Rapidamente somos convidados a arrancar a refeição com um delicioso tramezzino de salmão curado, numa versão miniatura de uma delicada sanduíche de salmão, ervas e ovas de salmão, um corneto mini que nos remete para o clássico corneto de morango de toda a vida, mas que aqui é preparado com queijo das Ilhas, tomate e massa fina e crocante, uns patinhos de borracha que aqui não serviam para brincar no banho mas sim para mergulhar na untuosidade e riqueza do foie gras, que aliás combinou muito bem com o último momento, um shot de espresso martini. À Flor da Pele –  Lírio, gaspacho, tomate, coentros, pepino e azeitona
Arrancamos logo com um prato com a assinatura do chef a ficar bem evidente do plating ao número de elementos. Lírio marinado e levemente selado, diferentes texturas de pepino, tomate, azeitonas explosivas e texturas de coentros. Um prato repleto de elegância e frescura ideal para o início da degustação.

Seguiu-se o momento “Olhos vendados”, onde somos convidados a comer de olhos vendados e a adivinhar os elementos que compunham o prato unicamente através do seu sabor. Gamba do Algarve crua (o elemento mais fácil), gel de citrinos e uma envolvente espuma quente de alho francês, contrastaram bem com riqueza do creme de gema (que não identifiquei) e o funcho.

Um momento que não é de todo o que procuro no fine dining aos dias de hoje, mas que percebo a sua utilização, mais ainda para quem estiver a ser introduzido ao conceito. A julgar pelos rostos de encanto na sala, sou eu que não estou certo!

No copo um Lacrau Moscatel Galego 2022, que apesar de seco demonstra bem as características doces e tropicais da casta. Pão e manteiga

A bom ritmo continuamos com o pão que cada vez mais ganha espaço a meio dos menus, desta feita com “À luz da vela” composto por uma excelente seleção de pães de massa mãe da padaria Bom Miolo na Póvoa de Varzim, servidos com uma vela de manteiga aromatizada com óleo de trufa.

As Folhas a CairRaviolis de Abóbora, Boletus, sementes de abóbora, avelã e bolota
Um prato de conforto com boas nuances técnicas e repleto de sabor e texturas que se revelou num dos melhores da noite. Sabores terrestres, doces, ricos e equilibrados que conquistavam a cada colherada.

A harmonizar esteve um Procura na ânfora 2018 da Susana Esteban, cuja boa acidez e mineralidade fizeram um bom contraste com o prato.

A MaresiaRobalo a vapor, bivalves, algas e consommé de plâncton e caldo de peixe 
Um daqueles momentos que representam um mergulho no mar, o habitat ou o oceano. E foi isso mesmo que recebemos no prato, uma bomba de mar, com percebes, lingueirão e berbigão que casados com o bom caldo de plâncton nos transmitem uma sensação a mar irrepreensível. Além disso somos convidados a entrar no espírito Fat Duck em 2007, quando colocamos uns phones nos ouvidos em que o único som emitido é o do mar. Uma imersão no sabor mas também na envolvência do mar que resultou num ótimo prato que a título pessoal preferia apenas o peixe num ponto ligeiramente abaixo (ainda assim melhor do que a maioria do que vamos encontrando por aí).

Para este prato guardaram o vinho da noite, um Bairrada de vinhas velhas, blend de Maria Gomes e Bical que Vítor Matos engarrafou com o seu selo, Natura Calcariu 2016 com 60 meses de estágio em fuder usado de Mosel. Um vinho feito na Niepoort e selecionado em bom momento pelo chef. Um grande branco que representa bem o potencial dos brancos portugueses quando trabalhados de forma distinta.

Horta Marítima – Carabineiro, cenoura, gengibre, funcho, erva-príncipe e caviar
Como em qualquer restaurante com as aspirações ao estrelado em Portugal não poderia faltar o carabineiro (não que me importe nada… mas até podiam começar a apostar no alistado que prefiro). A riqueza de sabor do carabineiro (com cocção irrepreensível) contrastou bem com a doçura da cenoura, a salinidade do caviar e a frescura do funcho e dos restantes elementos.  Muito bom!

Acompanhou um Reserva Branco Quinta da Vacaria de 2020. Um perfil “clássico” do Douro com as castas típicas da região, idêntico aos demais que o enólogo executa na região. Um vinho que não me enche as medidas mas que cumpriu a sua missão de harmonizar. Mas digamos que não é fácil servir um branco “típico” depois do vinho anterior.

Carne na cinza – Ribeye maturada, aipo assado, alho negro, pimento assado, couve de bruxelas, trufa e molho de carne
Numa degustação há sempre pratos que nos marcam menos, e aqui foi o caso deste ribeye – boa carne, bom puré de aipo assado e bom molho, servido em quantidade reduzida para podermos com ele ligar todos os elementos do prato. O facto de a trufa também já não exibir toda a sua pompa e fragrância também contribuiu para um menor interesse do prato.

Chegando a vez de um tinto, bebeu-se um Quinta da Vacaria tinto 2020, com um perfil idêntico ao seu irmão branco, complexo e extraído com a touriga nacional a sobressair acompanhada pela marca da madeira.

Da Estrela – Compota de abóbora, gelado de requeijão, nougat e merengue
O momento dos queijos ou da pré sobremesa mais leve e fresca foi substituído pela conjugação clássica de requeijão e doce de abóbora. Conforto, sabor e texturas bem conseguidas numa boa primeira sobremesa.

A minha  InfânciaAlgodão doce, caramelos, macaron
O Qr code leva-nos à história do chef e da sobremesa que chega à mesa ao ritmo do chocalho, tão característico das vacas leiteiras dos campos transalpinos. Uma conjugação de doces e memórias com que faço facilmente reminiscência – a minha infância numa aldeia transmontana resultou muitas vezes na espera pelos doces com que os tios emigrantes nos presenteavam. Quanto à sobremesa onde os sabores mais doces e os elementos soltos repousavam sobre mousse de baunilha, mascarpone  e notas de fruta tropical. Muitos elementos com bastantes e distintas notas doces que preferi em separado que no conjunto geral.

I Have a Dream – Trufa de matcha, tartelete de yuzu e financier de wasabi
Com os petit fours o chef diz-nos que sonha fazer uma viagem pelo Japão (sonho que partilhamos, já agora!), uma boa trufa de matcha servida no bonsai, uma delicada e fresca tartelete de yuzu e um diferenciador financier de wasabi (neste caso da pasta e não da raíz). Simples, bom e eficaz!

A acompanhar as sobremesas esteve um Tawny Quinta da Vacaria 20 Anos, bastante mais interessante que os seus congéneres de mesa a fazer jus à história da Quinta. As suas notas de caramelo, café, especiarias e frutos secos funcionaram em plenitude com os doces servidos.

Nota positiva para o serviço, totalmente no feminino, executado com técnica e precisão aliada a uma certa descontração na conversa que é o ideal para um espaço em que se pretende que haja tanta interação entre sala e comensal. A chef de sala multiplica-se e bem entre várias funções pelo que um/a sommelier bem preparado/a seria a cereja necessária no topo do bolo.

A zona exterior do Blind

Considerações Finais
Há muito que acompanho o trabalho de Vítor Matos, se em tempos lhe reconhecia mais valor técnico do que sabor, isso mudou há vários anos com um prato de pombo que serviu no Antiqvvm, mais limpo de elementos adjacentes, com uma cocção perfeita e um sabor a roçar a perfeição. Nos dias de hoje é fácil provar a sua cozinha (são várias as consultorias que assina, do fine dining à gastronomia mais popular) mas nem tanto o que sai das suas mãos. Pelo que é sempre prazeroso revê-lo de jaleca a apresentar as suas criações. Quanto ao Blind é nítida a sua pretensão à tão almejada estrela – se conhecessemos uma checklist sobre “o que fazer” ou “o que não fazer” certamente teria um grande número de vistos assinalados no momento da avaliação, mas não diria que será já o seu momento. Um restaurante sem grandes altos e baixos, sem erros de maior  e que parece perfeito para quem procura introduzir-se no mundo do fine dining, com momentos divertidos de interação e desafio que ajudam a “quebrar o gelo” que muitas vezes se sente neste tipo de restaurante. O menu de degustação de 10 ou 12 momentos varia entre 50 criações do chef, mediante a sazonalidade dos produtos pelo que prometemos acompanhar outras viagens.

Para terminar só mais uma nota sobre o Natura calcariu 2016, é mesmo um grande branco português, pelo que se tiverem a sorte de se cruzarem com ele não deixem de o provar. Serão muito felizes!

Blind – Torel Palace Porto
Preços a partir de 100€ (sem vinhos)
Rua de Entreparedes 42 – Porto

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Fotos: Flavors & Senses

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Torel Palace Porto

Quando um palácio barroco do século XIX se transforma num luxuoso boutique hotel sabemos que a experiência vai ser memorável. O Torel Palace Porto é um daqueles refúgios que nos faz viajar no tempo e nos envolve numa atmosfera irreal.

Primeira impressão
Clássico inigualável ao estilo palaciano, mas acolhedor o suficiente. Uma entrada imponente, uns funcionários sorridentes e uma receção onde livros descem do teto como estrelas!

O Torel Palace Porto criou a sua essência na homenagem aos mais icónicos escritores e poetas portugueses, por isso em cada recanto do hotel se identifica o seu tema: a literatura!

A biblioteca do Hotel

Quartos
O hotel possui 24 quartos, sendo 11 quartos e 13 suítes. Alguns com varanda, uns com vista para a piscina outros para a cidade. Mas todos partilham uma característica em comum: a atmosfera literária mesclada com elegância, classe, e até, um toque de sensualidade. Sim, leram bem! E sim, um quarto pode ser sexy!

Talvez tenha contribuído o facto de termos ficado na Suite Superior Bocage, onde fomos recebidos com a frase  “Os amantes são assim, todos fogem à razão.”

Um quarto clássico, de teto alto, paredes cheias de história, intocável pelo tempo mas reinventado com um toque contemporâneo. Uma instalação espelhada foi implantada no seu centro, fazendo com que de todos os cantos do quarto fossemos invadidos pela nossa própria imagem – mas trata-se, nada mais, nada menos, que a casa de banho, criada desta forma para não alterar a estrutura secular do local.

A arte através da literatura é claramente o mote do Torel Palace, e que mestria demonstraram ao criar esta atmosfera! A cama é extremamente confortável, com chá e café disponíveis durante toda a estadia. Cada recanto deste quarto era arte, como podem ver nas fotografias.

Blind

Restaurantes
Um dos ex libris do Torel é o seu restaurante, o Blind, com assinatura do premiado chef Vítor Matos, cujo lema antecipa a experiência: “O chef apura a comida, enquanto o cliente refina os sentidos”. Aberto desde 2020, o Blind define-se como um tributo à obra de José Saramago, “Ensaio Sobre a Cegueira”, onde todos os sentidos são postas à prova! Sala elegante, que também serve de Bar, e de apoio à piscina, é aqui que o menu Blind Emotions chega até nós.

É também aqui que é servido o pequeno-almoço, aqui, nota menos positiva, pouca variedade e ausência de alguns elementos importantes que são essenciais num hotel do nível a que associamos o Torel Palace Porto.

Sobre a nossa experiência ao jantar no Blind o João fala-vos noutro artigo.

Já após a nossa estadia o Torel Palace lançou a Florbela Pâtisserie na sua pequena biblioteca, que pretende trazer um pouco de Paris para o Porto. Como não poderia deixar de ser, a inspiração continua a ser a literatura, e então, esta Pâtisserie é uma homenagem à vida e obra da poetisa Florbela EspancaO pequeno almoço é também ele servido no Blind

Aqui poderão desfrutar de uma seleção de doces produzidos pela chef pasteleira Eva Monteiro a partir das mais refinadas técnicas de pastelaria francesa, enquanto folheiam um dos vários livros espalhados pelas estantes deste belíssimo recanto do hotel.

Serviços
O Torel Palace oferece os serviços habituais de um hotel 5 estrelas, incluindo serviço de transfer de ida e volta para o aeroporto (mediante marcação), babysiting, bellboys, concierge, serviço de lavandaria e room service disponível 24 horas, além de estacionamento ao lado do hotel.

O tecto mágico do piso superior do hotel

Apesar de não ter spa, o Torel oferece o Calla Wellness Suite que nos proporciona serviços personalizados de relaxamento, estética e bem-estar.

A piscina é um dos muitos recantos de pleno descanso que o hotel propõe. Por ela, sobe uma parede repleta de natureza e que transforma esta piscina num autêntico refúgio do bulício diário.

O Torel Palace tem magia, tem arte, tem literatura, tem história, tem passado e presente e, seguramente, terá um futuro risonho. É um hotel elegante, de toque palaciano sem ser prepotente ou arrogante, e os espelhos que se encontram em cada recanto conferem-lhe uma sensualidade desmedida.

Quero voltar, quero muito voltar!

Torel Palace Porto
Quartos a partir de 280€ 
Rua de Entreparedes 42 – Porto

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Fotos: Flavors & Senses

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Essencial

Essencial é nome e aparentemente conceito deste pequeno restaurante no nº 176 da Rua da Rosa no Bairro Alto. De decoração minimalista, ou se quisermos manter o chavão, reduzida ao essencial – onde as madeiras claras e os tons neutros dão um toque nórdico.

Mas façamos um pequeno briefing antes de nos sentarmos à mesa: André Lança Cordeiro é o artesão deste projecto, um cozinheiro que passou por França antes de se instalar num palácio em Lisboa e de dar a conhecer o seu nome num pequeno projecto denominado “Local”. Aqui, por conta própria, André decidiu reduzir a sua cozinha ao adjetivo que dá nome ao restaurante – boa cozinha e bons produtos.

Uma redução que não é feita de minimalismo ou modernismo mas sim por trazer para Lisboa o melhor da cozinha francesa, apostando no produto, com técnica e sabor apurado. Uma cozinha à qual muitos declararam sentença de morte, mas que aos poucos vai ganhando apoio e reconhecimento por parte de quem valoriza o trabalho artesanal de cada prato.

pão de massa mãe, manteiga e gordura de porco batida com alecrim

Neste teatro francês aberto aos comensais estão ao lado de André, e entre outros, Leonor Sobrinho (também conhecida por ser o seu braço direito e esquerdo) e Daniel Silva, que de apaixonado gastrónomo passou a chef de sala e sommelier.

Mas, passemos à mesa onde somos recebidos com pão bem quente, manteiga e uma menos provável gordura de porco batida com alecrim, tudo muito bem escoado com um Briords Vieilles Vignes Sur Lies 2020 de Muscadet, que demonstra que a carta de vinhos é tudo menos comercial ou aborrecida.

Ouriço do Mar, lima caviar e tártaro de carabineiro
Para começar a degustação um mergulho no mar, podia ser uma homenagem ao ouriço de Rafa Zafra no Estimar, mas a escolha de carabineiro, a acidez da lima caviar e o molho irrepreensível leva o prato para outro patamar e, claro, com um sotaque bem mais francês. Por mim podiam ter vindo 4 ou 5.

Foie gras, marmelo e brioche folhado
Falar em cozinha francesa não seria possível sem falar em foie gras, aqui servido num delicado e bem conseguido torchon mi cuit, que é como quem diz, que o dito fígado foi marinado e cozido levemente até atingir um ponto que o torna perfeito para barrar. Ao seu lado, marmelos bem trabalhados (não servem só para marmelada, como infelizmente é apanágio da nossa cozinha mais tradicional) e um brioche folhado que apesar do bom sabor, requer ainda mais apuro técnico.

Pâté en croûte de pato e laranja, foie gras, pistácio, cenoura e pera
Pâté en croûte é sinónimo do savoir vivre francês, raro de encontrar em Portugal, e mais, ainda bem feito! Tem sido ao longo dos últimos anos um dos grandes focos do trabalho de André Lança Cordeiro e um dos pratos que lhe deu fama durante a pandemia em regime de take away. Recheio exímio, repleto de sabor, frescura e doçura q.b., bem acompanhado pelo puré de cenoura, o confit de pera e os pickles. A gosto pessoal apenas as laterais da massa mereciam um pouco mais de cozedura para um melhor contraste entre massa e recheio.

No copo, estes dois ícones da cozinha fizeram-se acompanhar pelo Domaine de Bellivière Vieilles Eparses de Eric Nicolas no Loir. Um 100% Chenin cuja mineralidade e as notas cítricas conjugadas com algum mel fizeram uma boa harmonização com os pratos.

 Linguado, agrião, aipo, trufa, topinambour assado e molho de champagne e ovas de arenque
Continuamos numa cozinha clássica mas tão atual como qualquer outra, com a excepção de dar um pouco mais de trabalho do que por o peixe no sous vide à temperatura certa! Peixe no ponto, com todos os elementos a casarem lindamente na boca, com notas de frescura e terra a ligarem muito bem com a salinidade do molho. Houvesse caviar e podíamos estar em qualquer dos estrelados de Paris (o preço é que seria outro…).

Como não há cozinha francesa sem champagne bebeu-se Domaine Piollot Come das Tallants, um brut nature 100% pinot noir, que tendo servido bem o seu propósito seria ainda melhor no final com um prato de queijos, dado o seu aroma e robustez.

 Pithivier de Lombo, foie gras, puré de aipo caramelizado e alho negro, mille-feuille de batata crocante
Outro dos selos da cozinha de André Lança Cordeiro tem sido o seu trabalho com a massa folhada salgada, inspirado por mestres como Bruno Verjus, Yohan Lastre ou Karen Torosyan, muitas têm sido as suas propostas e recheios. Aqui, provou-se um complexo bife do lombo com farce, foie, legumes, couve, tudo cozinhado no ponto com máxima precisão – deve ser um alívio tremendo o momento de colocar a faca na massa e perceber que tudo bateu certo. A acompanhar o pithivier tudo ao mais alto nível, do jus ao puré e, claro, a abençoada trufa negra que o André aprecia tanto quanto eu.

A harmonizar esteve um menos irreverente Quinta do Monte d’oiro Reserva 2013, um syrah com apontamento de viognier, repleto de fruta madura mas sem ser chata com as notas de pimenta da darem-lhe alguma graça. Na boca denotava taninos polidos e a madeira muito bem integrada. Não era algo que esperava encontrar depois dos restantes vinhos, mas não comprometeu!

Soufllé de Avelã e trufa
Quem acompanha o trabalho do André nas redes sociais muito provavelmente chegou até ele pelas fotos pecaminosas de pastelaria francesa que vai ensaiando. Soufllé é sempre um exercício complexo ao qual a maioria dos pasteleiros foge, mas em boa hora o André não o fez – delicado, rico e saboroso e elevado ao último nível de epicurismo com a trufa fresca raspada no momento. O meu Inverno podia ser cheio disto…

Mille-feuille de baunilha, caramelo salgado
Considerado por todos que o provam como o melhor de Lisboa, desde que o vi online pela primeira vez que despertou em mim uma grande curiosidade, primeiro por ter efetivamente um aspecto de rara perfeição e segundo porque me lembrava um dos melhores mille-feuille que já tive oportunidade de provar, o do Relais Louis XII do chef Manuel Martinez à época com duas estrelas Michelin em Paris, qual o espanto quando um dia percebo numa entrevista que o André passou pela pastelaria do restaurante durante a sua passagem pela capital parisiense. Quanto à sobremesa não há muitos adjectivos a acrescentar, todos a deviam provar.

Para terminar uma já longa refeição e acompanhar em boa forma os doces, a escolha do Daniel Silva foi para um dos meus produtores favoritos de Jerez, um Cream Tradicion 20 anos da Bodegas Tradicion. Este vinho é o resultado da combinação de Pedro Ximénez com incrível Oloroso de Palomino Fino, que se torna num vinho muito particular do qual é difícil não gostar.

Sobre o serviço não há nada a dizer, é como estar em casa dos cozinheiros com um amigo que percebe de vinhos a servir-nos o copo. Mais uma vez o essencial, portanto!

Considerações Finais
De look nórdico e matriz francesa, o essencial é uma lufada de ar fresco – pode parecer estranho eu sei! Como é que um restaurante de cozinha clássica francesa pode ser algo refrescante e inovativo, perguntam vocês? Mas a resposta é simples, perguntem-se quantos de vocês, numa era de inovações, minimalismos e criações, muitas das vezes completamente desenquadradas, já tinham provado um pithivier na sua melhor expressão? um pâté en croûte? uma poulard en vessie, ou até mesmo um paris-brest?

Pegar em clássicos que moldaram a história da cozinha, reduzi-los ao foco do sabor e maneja-los com um rigor técnico invejável é algo difícil de encontrar e apenas acessível a quem está disposto a sofrer muitas horas na cozinha, isso e a quem se pode dar ao luxo (fica sempre a dúvida se será luxo ou ego controlado) de falhar, falhar outra vez, e repetir. Numa era moldada por influências estéticas e de empratamentos, André Lança Cordeiro deixou-se influenciar pela complexidade e a forma de fazer e isso é o que torna a sua cozinha tão refrescante. Se a cozinha também tem erros? tem! Mas a perseverança que se vive nesta cozinha indica-nos que são erros passageiros de quem vive mais como artesão do que como chef. Em resumo, tudo aqui se resume ao essencial – boa comida, e essa é a única opção do menu!

Essencial
Preços a partir de 50€ – (sem vinhos)
Rua da Rosa – 176, 1200-390 Lisboa
+351 211 573 713

English Version

Fotos: Flavors & Senses

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