Gucci Giardino 25

Inaspettato – Cachaça infusionada com Manjericão, licor e figo, baunilha, soja, pimenta preta e chá preto
 

Em 2022 descobri por acaso, entre pesquisas no youtube, um video da mixologista Martina Bonci a preparar dois cocktails de assinatura que me despertaram o interesse. Foi o meu primeiro contacto com este Gucci Giardino 25, que acabara de abrir. Poucos meses depois voltamos a Florença e, obviamente, o bar debruçado sobre a belíssima Piazza della Signoria, estava no topo da nossa lista de prioridades.

O bar faz parte do Gucci Garden, o espaço criativo e multicultural da icónica marca, que abriga, não só um bar, como também com uma loja, um museu e o restaurante estrelado Gucci Osteria.

A decoração respeita a imagem da histórica florista que ali existiu e combina a atmosfera fiorentina com a identidade da marca, resultando numa espécie de café toscano com feeling de bistrot.

O Gucci Giardino 25 vive não só essa dualidade de ambiente mas também uma de identidade, sendo um espaço  que se abre à cidade ao longo de todo o dia, passando pelos Cafés e o pequeno-almoço, o chá das 5, até que, claro, as noites se transformam em animados eventos por onde passam quer fashionistas quer entusiastas da cocktelaria.

A carta reflete isso mesmo, com propostas que vão variando ao longo do dia, entre pastelaria italiana, pastas e os melhores cortes de charcutaria selecionados com a garantia de Massimo Bottura e da sua Gucci Osteria.

Mémoire di Negroni – gin, vermute branco, Luxardo bitter bianco, yuzu sake, bitter de toranja
 

Como mencionei anteriormente, o Bar é liderado por Martina Bonci, cuja assinatura é facilmente encontrada ao longo do menu. Os seus Cocktails são como verdadeiras e coloridas obras de arte, repletas de identidade, cores vibrantes, sabores equilibrados e frescos com várias camadas, servidos em copos elegantemente minimalistas.

Elisir D’Elicriso – um cocktail especial, feito em parceria com Giorgio Bargiani do The Connaught Bar
 

Apesar da sua curta vida, o Giardino 25 tem reunido aplausos um pouco por todo o lado, dos apreciadores, aos críticos, passando por guias e premiações que Martina e a sua equipa têm recebido, como a posição nº50 no Top 500 Bars ou o recente 50Best Discovery (aqui entre nós, e fazendo justiça à qualidade da sua oferta, bem que mereciam figurar entre os premiados do 50Best bars).

Ricordo della nonna – bulleit com infusão de castanhas, manteiga de amendoim, licor de pera e amaretto Adriatico
 

Entre os diversos cocktails provados nas nossas visitas há dois clássicos que sempre me conquistam: o Mémoire di Negroni e o Chi Si Ferma è Perduto, o primeiro sendo obviamente um riff do icónico cocktail florentino, incorporando inclusivamente a cor da cidade e o segundo, como uma versão melhorada e refinada de uma Spicy Margarita.

Chi Si Ferma è Perduto – Casamigos, Italicus, Ancho Reyes verde, menta e limão
 

Apesar destes ois amores que se tornam imprescindíveis a cada regresso, nesta última visita fomos surpreendidos por algumas criações inovadoras da nova carta, como por exemplo o fantástico Inaspettato que combina uma pouco usual Cachaça (nos bares italianos obviamente)  infusionada com Manjericão, licor e figo, baunilha, soja, pimenta preta e chá preto que era depois servido com finas fatias de Parmigiano Reggiano. Um cocktail que nos proporcionou uma explosão de sabores umami, com todo o tipo de notas doces e salgadas enriquecido ainda mais quando provado com o queijo. Um verdadeiro Pairing!

Let’s play dirty – Tanqueray Ten, Noilly Prat, pimenta preta e salmoura
 

Poucas coisas me desanimam mais do que um bar cuja sua equipa não incorpore o verdadeiro espírito e arte de estar atrás do balcão. Mais do que mixologia, química e até um pouco de alta cozinha, o bartender é um ouvinte, um comunicador nato e, claro, um mestre hospitaleiro. Isso é o que nos faz voltar ao Gucci Giardino 25, uma equipa jovem que sabe enfrentar os desafios (incluindo uma exigente cliente de 3 anos!), que sorri, conversa, sugere e compreende os gostos dos clientes.

O que dizer quando a cocktails de assinatura elegantes e surpreendentes se junta o verdadeiro sentido de hospitalidade?

a cliente mais difícil aprovou o seu mocktail
 

Que venham muitas mais viagens a florença e a este Gucci Giardino 25.

Preços a partir de 19€
Piazza della Signoria, 37r – Florença
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Gucci Osteria (Revisitado 2023)

Não há muito tempo publiquei aqui sobre um jantar decorrido no final de 2019 na Gucci Osteria  (ver artigo). Desde então muito mudou, Karime tornou-se na primeira mulher mexicana a conquistar a almejada estrela Michelin, venceu o prémio FoodArt no Best Chef Awards e, claro, Takahiko “Taka” Kondo, seu marido e braço direito de Massimo Bottura na Osteria Francescana, seguiu o amor e a estabilidade familiar e rumou também ele a Florença para, em conjunto, partilharem a cozinha.

Qual Charles e Ray Eames, Karime e Taka combinam amor, paixão e dedicação como motor da criatividade e de um espiríto livre que nos transmite dois mundos fusionados num só.

Não é uma mera cozinha a quatro mãos, é um fio condutor que combina México, Itália e Japão, com diversão, linguagem e identidade própria… aqui vive-se a cozinha de Karime e Taka.

Ao revisitar este espaço encantador da Piazza della Signoria,  continuo a pensar no quão diferente é este restaurante de selo “Gucci”, dos espaços gastronómicos abertos habitualmente pelas grandes casas de moda. Seria tão mais simples fazer menos, apresentar uma cozinha conservadora, encher os pratos e as decorações de monogramas e as redes de influenciadoras mediáticas, que estaria sempre cheio e com fila à porta para o instantâneo do momento.

Felizmente nunca terá sido esse o interesse da casa italiana e muito menos de Massimo Bottura que assume este casamento como um selo de qualidade e garantia.

Pequeno-almoço italiano
Pequeno-almoço italiano

Onde se esperaria encontrar um pouco do classicismo italiano, encontra-se a Itália de Karime e Taka, uma Itália de referências, mas repleta de outros ingredientes, nuances e sabores que nos levam a marcar o passaporte num mundo muito seu.

Para iniciar, somos prontamente recebidos com um Champagne Brocard Pierre L’égarée com uma produção exclusiva de 300 garrafas para a Gucci Osteria . Zero Dosagem numa mescla clássica de pinot e chardonnay que se revelou com marcante no nariz, com curiosas notas de coentro em contraste com a baunilha.

O menu está dividido em dois menus de degustação, o mais curto “As nossas lembranças” e o mais longo “As nossas novas memórias”, havendo a possibilidade de escolher 2 ou 3 pratos à carta e claro de juntar ao menu os famosos tortellinis de Bottura.

Esse “espiríto italiano” foi bem visível logo no início com a apresentação dos diferentes amuse-buche como um pequeno almoço italiano onde nem tudo é o que parece.  Um corte exclusivo de Cinta Senese feito por Paolo Parisi feito em particular para a Osteria, um cone de Tzatziki e tarama, um Beignet de papa al pomodoro e parmigiano, um Maritozzo com queijo robiola, um Canoli (que quer ser um Canelloni), recheado com ragù e queijo de cabra, e como não poderia deixar de ser um expresso, preparado a partir de café e um caldo de feijão preto. Irreverente, elegante e sobretudo delicioso e divertido!

Purple Corn Tostada, Tostada de milho roxo, Bonito, especiarias, citrinos
O primeiro grande clássico de Karime na cozinha do Gucci Osteria , continua a ser uma iressístivel proposta de homenagem às suas origens, conjugadas com sofisticação técnica e muita frescura.


Baby, it’s Cold Outside, chawanmushi, mexilhões, abóbora, enguia e caviar
Um óbvio momento das origens de Taka, com o Chawanmushi (espécie de creme ou pudim salgado japonês), servido como o próprio nome indica para dar conforto ao corpo. Delicado, saboroso e levado a outro patamar de contrastes pelas notas de mar e sal do caviar.

Memórias de um Verão em Versilia, Bacalhau e sabores mediterrâneos 
Mais um prato que respira Japão na sua essência e subtileza, embora viva de ingredientes bem mediterrâneos. Diferentes texturas de bacalhau numa cocção irrepreesível que para um palato português precisava apenas de um pouco mais de sal. Nota alta para o fundo de aipo, funcho e amêndoa que dão uma dimensão distinta ao prato.

A estas primeiras entradas seguiu-se pão quente e a sua fiel companheira
Taka’s Bun – Barriga de porco de Cinta Senese, couve e maçã verde
Outro clássico da Osteria e a memória da cozinha mais “relaxada” da abertura do espaço, de onde lembro também um hamburger de Bottura. Aqui Karime quis dar a Taka um pouco dos sabores da sua terra natal, e conseguiu! Leve, untuoso, fresco e divertido!

No que aos vinhos diz respeito, depois do champagne seguiu-se um rosé da Eslovénia, Guerila da Meteri 2021, feito a partir de cabernet e merlot segundo agricultura biodinâmica. Frutado mas sem excessos de doçura, com notas de morango, cereja e cassis  num vinho com boa estrutura.

Animella Mia – Molejas, quinoa crocante, Tomatillos, salsa verde
Moleja é um daqueles ingredientes que mexe verdadeiramente comigo, o seu sabor e textura quando bem trabalhada é extraordinária. Aqui, provou-se uma das mais ousadas e criativas versões que já provei! De clara inspiração Mexicana, a moleja é panada com quinoa que se torna crocante, a gordura é cortada pela acidez da salsa verde e dos tomatillos numa espécie de pico de gallo. Poderia comer isto todos os dias!

Ao copo chegou um Chianti Classico Isole e Olena 2020, repleto de ervas e flores no aroma e frutos vermelhos no palato. Vivo mas polido e marcante, revelou-se uma boa aposta para a Moleja.

Ponche  Hibiscus, canela e maçã casciana
A quebrar a típica onda de pré-sobremesas frescas e ácidas, e porque aqui nem tudo é o que parece, o “punch” virou sobremesa, com várias texturas, delicadeza e doçura singular do hibiscus a ligar todos os elementos.

Vin Brulé
Outra bebida tradicionalmente presente nas festas natalícias é o Mulled Wine ou vinho quente, obviamente mantém-se o “mojo” da sobremesa anterior, pelo que somos brindados com uma brilhante tarte, sorvete, o próprio do vinho quente e um mascarpone delicioso. Quando o aparentemente simples se revela um grande final…

Ou talvez ainda não fosse o final!

Enguia, Abóbora e raíz forte
Enguia, Abóbora e raíz forte

Estranhe-se ou não, depois da “sobremesa” seguimos o menu de forma surpreendente e com um dos melhores momentos, Enguia ao estilo japonês, uma espécie de ravioli de abóbora e para conjugar e elevar toda a doçura, raíz forte raspada. Um Japão-Itália que perdura na memória.

Por esta altura perguntava-me se se teriam esquecido dos Tortellini a que havia pedido ao início, mas depois da enguia poucas regras se mantêm, e assim foi…

Tortellini, trufa branca de Alba e parmigiano reggiano
Eis os famosos tortellini de Bottura com creme parmigiano reggiano, e porque estavamos no seu pico, as melhores trufas brancas do ano. Os tortellini pareceram-me ainda mais pequenos e técnicos do que no passado, creme igualmente delicioso e sobre o aroma, não há muito que vos possa transmitir. Efetivamente como dizem no restaurante, qualquer momento é bom para os tortellini.

Petit fours

Por fim foi a vez dos petit fours, repletos de espírito outonal com macaron de couve toscana, pasta frita de castanha, bombons e até um pão de queijo. Mais uma vez, tudo em altissimo nível, com a classe e a diversão que se prometia desde o início.

Sobre o serviço, a elegância foi além da palamenta Gucci, das palavras em português, às pequenas brincadeiras com o elemento mais novo da mesa tudo decorreu como esperado, com destaque para o Raymond que se ocupou de nós e ainda fez as recomendações de vinhos certeiras.

Considerações Finais
O tempo tende a fazer bem aos restaurantes da mesma forma que as boas relações tendem a fazer bem às pessoas. Foi isso que pudemos experienciar neste regresso à Gucci Osteria , debruçada sobre uma das praças mais bonitas do mundo, a piazza della Signoria. O restaurante está diferente, está divertido mas simultaneamente mais sério no que toca à concepção da sua cozinha. O fio condutor tornou-se a história de Karime e Taka, as suas vivências e a sua interpretação – muito própria –  de uma Itália que por vezes se leva demasiado a sério.  A felicidade do casal trouxe-lhes o mojo criativo para romper barreiras e levar o restaurante mais além! É certo, e bem, que na porta continua o nome de Massimo Bottura, mas a certeza absoluta é a de que este é hoje o restaurante de Karime e Taka e que Bottura terá todo o orgulho nisso!

A ir e voltar!

Osteria Gucci
Preços a partir de 120€ (sem vinhos)
Piazza della Signoria, 10 – Florença

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Luca’s by Paulo Airaudo

Criado para ser o porta-estandarte do Hotel La Gemma, o Luca´s presta homenagem ao patriarca da família Cecchi que infelizmente não pode acompanhar a famíla na sua entrada no ramo hoteleiro.

Com o objectivo de trazer até Florença um toque internacional e de sofisticação, algo raro na cidade, uniram esforços com Paulo Airaudo, o chef Argentino a que já ninguém fica indiferente. Com o Passaporte bem preenchido, e passagens pelo México, Peru, foi na Europa, mais propriamento no The Fat Duck (Inglaterra), Arzak (San Sebastián) e Magnolia (Itália) que ganhou a base para conquistar a sua primeira estrela na Suiça.

Apesar da juventude, Paulo nasceu apenas em 1985, o seu espírito empreendedor e disruptivo, levou-o de novo a San Sebastián, onde hoje comanda o Amelia com duas estrelas Michelin – considerado por muitos o mais interessante restaurante da cidade basca – bem como muitos outros projectos de restauração. Com restaurantes em Barcelona, onde conta com uma estrela no Aleia, em Bogotá, Hong Kong, Inglaterra e, claro…. agora também na cidade das artes com a sua cozinha de matriz italiana.

O Luca’s respira Art Deco, num ambiente de elegância extrema completamente ligado ao design do hotel.

É facil entrar na sala de tons esmeralda e deixarmo-nos levar por uma certa coolness e imaginar que a sala cheia seria certamente o cenário perfeito para um festim dos jovens irmãos Cecchi, repletos de boa comida, moda e champagne, muito champagne!

Já confortavelmente instalados, tudo na mesa respira fine dining embora a pretensão seja mais de bons momentos e diversão, a qualidade das louças, os tecidos e a própria equipa deixam antever ao que vamos.

Amuse Buches – cornetto de mortadella e tartelette de lavagante e straciatella

Começamos com uma série de amuse buches, bem executados, com contraste de texturas, sabores leves e elegantes que prepararam bem o palato para o menu. O destaque vai claramente para caldo de alcachofras com notas de baunilha servido ao início e que nos reconforta e,claro, a Ostra com caviar e molho de champagne, que nos levou pra bem longe do centro da toscana. Obviamente, tudo foi muito bem depurado por um espumante Franciacorta Marchese Antinori Cuvée Royale.

Ostra e caviar

Seguiram-se ótimos grissini artesanais, como é apanágio dos restaurantes gastronómicos italianos, e um sourdough bem executado que é como uma benção ao lado do deslavado pão toscano habitual.

Lírio, nabo, água de tomate e ume kosho
Para dar início aos pratos, uma belíssima flor de Lírio e Nabo, numa reinterpretação do crudo italino, que nos traz notas de um casamento perfeito entre o Japão e a Itália. Delicioso o contraste entre a pasta picante e doce de ameixa, com a frescura do nabo e da água com a gordura e delicadeza do peixe.

Tortelli, lingueirão e molho de vin jeune
Um clássico toscana – raviolo de batata – servido com a magia de uma cozinha de autor. Sabores e texturas brilhantes, com um ótimo toque de mar a equilibrar a riqueza e untuosidade do molho. Poderia passar todo o jantar a comer isto!

A harmonizar esteve um Pinot Grigio Bottega Vinai 2022, ainda muito jovem, mas fresco e com uma agradável acidez para ligar com os pratos.

Tamboril, bagna càuda, amêijoas, batata e acelgas
O prato principal levou-nos para um tamboril cozinhado em duas etapas, mas que resultou mais seco do que pretendia. Nota positiva para os acomapanhamentos, nomeadamenta a bagna càuda modernizada pelas ervas e as ovas de truta, e a combinação dos sabores mais térreos com as notas de mar. Poderia ter sido um belíssimo prato!

Para não cairmos na rotina do peixe/vinho branco, optou-se por um Pinot Noir de 2020 Bourgogne “Maison Dieu” do Domaine de Bellene . Um Tinto leve de aroma fácil e corpo curto, que limpou facilmente o molho sem se sobrepor em algum momento ao prato.

Flan de Cabraameixa, crocante de mel e aveia
Onde poderiamos pensar numa panna cotta, surge um flan de cabra de consistência sedosa e sabor delicado, muito bem combinada com os sabores doces e levemente ácidos da ameixa e o crocante de mel e aveia.

Um simples mas encantador final!

Para a sobremesa e em jeito de digestivo provou-se, não um, mas sim dois licores, um François Peyrot de Pera e Cognace um Amaro Naturale. Duas bebidas muito distintas mas que cumpriram muito a sua missão, cada uma no seu estilo.

Os Petit four com um irresístivel Canelé, um Pâté de fruit gianduja e framboesa.

O serviço decorreu sem falhas, com um cuidado especial com a nossa toddler e as suas necessidades – o que muitas vezes pode ser visto como um entrave ao serviço, foi ultrapassado com facilidade, haja vontade e uma boa dose de simpatia!

Olivia Cappelletti e Tommaso Querini comandam a cozinha do Luca’s

Considerações Finais

Paulo Airaudo e a sua equipa liderada por Olivia Cappelletti, tem aqui em mãos um diamante em bruto com localização, decoração, bar e uma áurea de romance antigo ao bom jeito dos anos 20, que nos cativa ao primeiro contacto. A proposta gastronómica assenta num pequeno menu onde se privilegia a degustação, com o objectivo de perceber todas as influências e nuances desta cozinha “italiana”. Sugiro que optem pelo menu mais longo, sendo que em termos de quantidade o menu de 4 pratos nos pareceu um pouco curto (por mim ainda estaria agora a comer Tortellis!). Apesar disso, o menu é seguro, sem grandes riscos, acredito que não seja esse o objectivo, com a cozinha de conforto a ganhar uma roupagem distinta e internacional.

Olhando a isso e conjugando as sensações que o espaço nos transmite com a estética do hotel e o percurso da família Cecchi, este Luca’s tem tudo para se tornar numa espécie de Costes em jeito italiano, ainda que aqui haja um carácter mais gastronómico.

Antevejo, assim, um bom futuro, repleto de uma clientela agitada e internacional que promete mexer com o classicismo fiorentino.

Luca’s by Paulo Airaudo
Preços a partir de 115€ (sem vinhos)
Hotel La Gemmma
Via dei Cavalieri 2c, 50123 – Florença

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Hotel La Gemma

Mais uma visita a Florença, mais umas lágrimas instantâneas mal avisto a obra-prima de Brunelleschi a rasgar os céus. A cada visita, a cidade parece acolher-me com lágrimas de admiração. Desta vez, encontrei refúgio no La Gemma, um hotel que rapidamente se tornou numa segunda casa.

O lema do La Gemma é “Inspired by family, Driven by Love” e eu não poderia concordar mais.

Situado na Via dei Cavalieri, a poucos metros de alguns dos locais mais idílicos da cidade, como a Piazza de La Signoria, a Ponte Vecchio ou a Piazza dell Duomo, o La Gemma é um boutique hotel de extrema elegância e bom gosto.

Aberto em Junho de 2023 pela família Cecchi e inserido no Palazzo Paoletti projectado pelo aclamado arquitecto Tito Bellini em 1875 e onde outrora funcionou a Corporazione degli Albergatori, o La Gemma é como uma esmeralda lapidada por uma família profundamente envolvida em arte, arquitetura, moda e design, que faz com que o hotel capture na perfeição essa combinação de arte discreta, intensa e eclética.

Uma das obras mais marcantes que podemos encontrar ao longo do hotel

Primeira impressão
A memória imediata que tenho da nossa chegada é o sorriso simpático de um dos funcionários que viria a descobrir mais tarde ser Gian Luca, o Diretor de Food & Beverage! A Francisca adormeceu no carrinho e por isso fiquei na rua a passear com ela enquanto o João fazia o check-in. O Gian Luca veio ter comigo, sorriu-me e disse-me um simples “Buongiorno” daqueles genuínos!

O nosso quarto ainda não estava pronto (era muito cedo) por isso o Concierge tratou de nos arranjar uma reserva de última hora num dos restaurantes clássicos de Florença.

Regressamos depois dum belo almoço no Osteria Delle Tre Panche e de um passeio para ver a cúpula mais especial do mundo, a cúpula de Santa Maria del Fiore.

Uma receção pequena, cosy, com o verde esmeralda e o brilho e os reflexos dos espelhos dourados a fazerem-se sentir. À esquerda, um espaço de bar, com ambiente cosmopolita, do lado direito uma sala de estar elegante e sóbria, com obras de arte subtis e iluminação suave.

O ambiente pareceu-me de imediato um tanto ou quanto de Art Déco!

É curioso estar num edifício que outrora foi um palácio fiorentino do século XIX com detalhes da decoração a remeter-nos para o Brasil, com os quadros e os papéis de parede com motivos tropicais e a arquitetura a fazer lembrar os loucos anos 20! Que combinação inusitada que tão bem se enquadra na histórica Florença!

Um toque especial foi a presença de um funcionário que falava português, tornando a estadia ainda mais acolhedora. Enquanto finalizávamos o check-in, sentei-me na pequena sala de estar e senti-me em casa, acredito que o facto do La Gemma tanto me fazer lembrar a nossa Uffizi Clinic, tenha contribuído para isso!

Notam-se alguns detalhes ainda meio atrapalhados mas o hotel tinha ainda poucos meses quando o visitamos, pelo que podemos concluir que será perfeitamente normal e que a logística e operação ainda não esteja no melhor das suas capacidades.

Quartos
O hotel é relativamente pequeno, com apenas 39 quartos, que se dividem em quatro tipologias – Superior, Deluxe, Loft Suite e Penthouse Suite. Ficamos num Loft Suite, composto por um pequeno e charmoso terraço que fez as delícias dos meus cafés de fim de tarde. Uma sala composta por uma zona de cozinha, com placa de indução, frigorífico (Mini bar repleto de bebidas não alcoólicas complementares à estadia e que eram repostas diariamente), e uma banca que deu imenso jeito para lavar todos os utensilios necessários para quem viaja com filhos. Ainda na sala, uma zona com sofá e televisão e uma mesa de escritório.

As peças decorativas eram de uma elegância sem igual. Sem excentricidades mas com detalhes de luxo simples. As cores predominantes, assim como no restante hotel, são os verdes e o rosa claro, inspiradas nas esmeraldas e talvez na palete de cores do vizinho Duomo!

Já no quarto, uma cama grande, e extremamente confortável, com lençóis de tecido incrivelmente sedoso.

A casa de banho era espaçosa, elegante e toda em mármore branca. Faltou-me uma banheira para relaxar no final de noite.

Nota alta para a qualidade dos amenities Votary, de produção local. Dos melhores shampoos que já experimentei num hotel.

Luca´s, o restaurante com assinatura de Paulo Airaudo

Restaurantes
O hotel conta com um bar e um jardim de inverno lindíssimos, com um ambiente cosmopolita, mas familiar, que tanto caracteriza o La Gemma Hotel.

A carta de cocktails é bastante interessante e ainda houve tempo para provar o negroni numa conversa bastante descontraída e animada com a equipa. Quer dizer, o João teve tempo para isso, que eu tive que ir adormecer a criança!

Junto ao bar temos o belíssimo Luca’s restaurant, com assinatura do celebrado Chef Paulo Airaldo, que se tem tornado famoso pelo seu restaurante Amelia em San Sebastián (**Michelin) e por vários outros projectos pelo mundo.

Foi aqui que tomamos todos os dias o pequeno almoço, onde os ovos fizeram a alegria das nossas manhãs.

Faltou talvez alguma sistematização nos timmings e na forma como os pratos são apresentados, algo que provavelmente com o tempo chegará facilmente a bom caminho.

Bom pão, boa pastelaria, bons ovos com otima confecção, mas tempos errados no serviço, falta de consistência duns dias para os outros, em algumas coisas pouca quantidade.

Diria que se depreende com uma equipa jovem, e ainda a trabalhar em conjunto há poucos meses. No entanto, nota altíssima para a simpatia de toda a equipa e o cuidado constante com a Francisca.

Ao jantar o caso muda de figura e tudo fica mais sério, requintado e romântico, incluindo o serviço. Tivemos também a oportunidade de provar aqui um menu de degustação, deixando notas de um futuro muito promissor, mas sobre isso o João falará noutro post.

Um delicioso prato de Tortelli – ravioli de batata com lingueirão e molho de manteiga

Serviços
O La Gemma é um hotel pequeno, intimista e familiar, mas tem os serviços habituais de qualquer hotel de luxo, e mais alguns que só os hotéis atentos às necessidades dos seus hóspedes conseguem ter.

Tem, como é óbvio, o serviço de room service 24h/dia, transporte a pedido e concierge. Mas tem muito mais do que isto, tem um programa chamado Golden Key com mais de 20 atividades e experiências que podem transformar por completo a estadia de qualquer viajante. Desde uma  “caça” às trufas pela Toscana a uma viagem de balão para apreciar a natureza perfeita de Val D’Orcia. Passando por jantares exclusivos em locais inacessíveis a visitas a estúdios privados de escultores em pleno ato criativo ou até casamentos. Tudo o que imaginamos e o que não conseguimos imaginar o La Gemma está disposto a realizar.

Outro dos ex libris do hotel é o spa Allure, um verdadeiro oásis de serenidade no centro de Florença. Com um circuito de água constituído por um enorme jacuzzi, banho turco e uma cascata de água gelada, é o local a não perder depois de um dia de kms e kms percorridos na cidade da arte.

Atendimento
A Equipa jovem sob a alçada de directores experientes é extremamente simpática e está bastante comprometida com a arte de bem receber. São sinceros nos seus sorrisos e é visível a forma como têm vontade de evoluir e de transformar o La Gemma na escolha dos turistas que procuram autenticidade e um ambiente familiar.

O La Gemma é um hotel muito recente, são visíveis as pequenas falhas no serviço mas que são facilmente colmatadas com a amabilidade da equipa.

Voltamos a Florença todos os anos, e quase posso garantir que numa próxima visita as pequenas falhas que experienciamos terão sido todas extintas para dar lugar a um serviço exímio.

No entanto, quero ressalvar que a simpatia da equipa, principalmente do Gian Luca e do Edoardo, foi das melhores montras de hospitalidade que já tive num hotel.

Hotel La Gemma
Quartos a partir de 430€
Via dei Cavalieri 2c,   50123 – Florença

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Il Palagio

Falar do Four Seasons Firenze é falar de serviço e hospitalidade na sua máxima expressão, uma panóplia de detalhes que o tornou reconhecido como a mais emblemática propriedade sob o selo Four Seasons e mais recentemente como o 9º melhor hotel do mundo pelo recém criado 50 Best Hotels.

Entrar no palazzo della Gherardesca, poder passear pelos seus infinitos jardins (tem o maior jardim privado de Florença) e observar todo o esplendor arquitectónico que ali se vive e respira é sem dúvida uma das experiências mais mágicas que podemos experienciar em hotelaria.

Mas deixemos toda a pompa e circunstância do hotel para outras núpcias (o hotel está agora numa ampla e árdua fase de remodelação e atualização dos seus quartos, pelo que escreveremos sobre eles assim que terminados), o que nos trouxe até aqui, o bar Atrium, sobre o qual falaremos noutro artigo, e o Il Palagio, o restaurante estrelado do hotel que faz verdadeiramente jus ao nome.

No que à decoração diz respeito, e como seria expectável, nenhum detalhe foi deixado ao acaso, sendo o Il Palagio, muito facilmente, a personificação do verdadeiro “restaurante romântico”. Tetos altos, lustres, obras de arte, mesas amplas e modernamente alinhavadas para contrastar, e bem, com a restante atmosfera do espaço, fazem deste um espaço, um espaço singular e intemporal, onde nos apetece verdadeiramente estar à mesa.

Uma série de amuse bouches, divididos em várias formas e texturas criadas em torno da beterraba. Da chip ao cannoli passando por uma pâte de fruit e uma tartelete. Uma curiosidade deste amuse é que vai variando nas suas formas e feitios sempre representando um legume que esteja no seu melhor momento.

Por detrás deste símbolo florentino está, desde 2021, Paolo Lavezzini, um italiano com sotaque português que antes passou por cozinhas de palácio em Paris, como o Alain Ducasse no Plaza Athénée, o Le Royal Monceau o mítico Enoteca Pinchiorri em Florença e nos últimos anos o Fasano e o extinto Four Seasons São Paulo.

Ao assumir este “projecto de uma vida” – como lhe chamaPaolo quis também trazer um pouco da sua essência enquanto pessoa e cozinheiro, bem como as suas vivências fora de Itália. Assumido adepto de uma cozinha de KM0 rodeou-se rapidamente dos melhores produtores toscanos para criar uma carta de matriz claramente italiana mas onde não faltam técnicas e sabores bem distintos (será fácil encontrar por lá um pão de queijo, por exemplo).

Mas melhor do que a história, é passar à experiência real que nos trouxe até aqui –  depois de recebidos por quem sabe o nome e rosto dos seus clientes e já confortavelmente instalados, somos brindados com um ótimo espumante italiano Franciacorta Cabochon Fuoriserie N°024, de acidez e estrutura bem equilibradas, bolha fina e persistente e notas repletas de nuances que conjugaram muito bem com os primeiros aperitivos com diferentes texturas de beterraba.

Couve, toranja e espuma de funcho
Outro amuse bouche, também ele focado no mundo vegetal, com ótimo contraste de texturas, intensidade moderada mas repleto de frescura e boa acidez para preparar o palato para o que se seguiria.


Depois de uns deliciosos grissini artesanais, chegou a vez do pão, felizmente não o tradicional pão Toscana sem sal, mas sim um pão de sourdough da famosa padaria florentina “Leonardo”, boa manteiga e um azeite delicioso da colheita de 2023, monovarietal Frantoio da LeFontacce.

A Cenoura
Cenoura de agricultura biológica servida em diferentes texturas e sabores, desde confitada no seu próprio sumo a uma brunesa, passando por puré e oléo a contrastar com uma cinza de cevada e trigo sarraceno. Um bom jogo em torno de um só elemento, onde não faltaram notas para contrastar com a doçura natural da raíz. Nota particularmente positiva para a adição do gengibre que elevou todo o conjunto.

Vieira, abóbora, yuzu e alcaçuz
Um prato que reflete bem as aventuras além fronteiras do chef, repleto de nuances, uma vieira irrepreensível e um delicado contraste de doçura e acidez que nos faz continuar a querer mais.

 Mero negro, funcho, amêijoas e molho iodado
Peixe delicado e bons pontos de cocção num prato de profundo sabor a mar, onde mais uma vez a frescura é um ponto a enaltecer.

A acompanhar os primeiros pratos esteve um riesling Herrenberg Kabinet 2022 de Maximin Grünhaus, um vinho que apesar de ainda muito jovem apresentou bem as características do produtor e cujos aromas mais frescos e herbáceos juntamente com algumas notas maduras no palato, fizeram um ótimo paring com os pratos apresentados.

Fusilloni de Clara de ovo, salmonete, toranja e caviar osietra
Um grande prato, de execução e sabor apurado que traz a tradição italiana a uma mesa de fine dining. Pasta feita com semolina e clara de ovo, provavelmente Pietro Massi, perfeitamente conjugada com os sabores marítimos, onde se destaca claramente o sabor rico do salmonete e a riqueza do caviar. Um grande prato!

A harmonizar esteve um Barbeito Boal 10 anos. É sempre um prazer encontrar vinhos nacionais nos menus dos restaurantes além fronteiras, e aqui, a escolha foi particularmente feliz, com um vinho meio-doce que mais facilmente veríamos com um foie gras ou queijo, a funcionar muito bem com um prato de profundo sabor a mar, muito por culpa das notas iodadas e a acidez do vinho.

Cevada de Garfagnana, mão de vaca e boletus
Um cevadotto de exceção que traz mais uma vez a cozinha tradicional à mesa, cuidando-a com outro rigor e técnicas mais apuradas. Sabor e profundidade num prato de conforto que nos leva a casa da avó e nos abraça com carinho. Muito, muito bom!

“Assado não Assado”
De partida para os pratos mais ricos, o chef quis brincar com um clássico dos assados de domingo servindo apenas aquelas partes crocantes a que ninguém resiste, com um molho profundo e intenso no qual não se consegue parar de molhar o pão. Podia ser numa qualquer tasca ou osteria, mas é num palácio que perdemos as maneiras e atacamos o prato para “fare la scarpetta”.

Mil folhas de Chianina, aipo e sésamo negro
Para terminar, e porque estávamos em pleno pico, não poderia faltar um prato elevado pela magnífica trufa branca. Evidente mais uma vez a predileção do chef por adicionar elementos vegetais frescos e marcantes aos conjuntos, aqui com o talo de aipo a refrescar muito bem o estufado rico da carne e os seus molhos. Tudo aromaticamente enriquecido por um belíssimo exemplar de trufa branca.

Por mim os pratos de carne poderiam ser sempre assim!

Para estes pratos mais ricos o sommelier propôs um Brunello di Montalcino 2018 Casanovina Montosoli de Le Ragnaie, e que belíssimo vinho se mostrou.  Complexo e concentrado na medida certa, com notas de fruta negra bem madura conjugadas com aromas herbáceos e de terra que na boca se transformam num conjunto equilibrado pela acidez de final persistente e longo na memória. Um grande, grande Brunello!

Chicória italiana, iogurte e estragão
Para não desequilibrar o menu, também a pré sobremesa recorre a plantas de sabor rico e peculiar, desta feita com radicchio ou chicória italiana e as suas notas picantes a balançar muito bem com o iogurte gelado e o estragão.

Polenta, castanhas, vermute e cavolo nero
Polenta doce, preparada com leite e servida como um creme a esconder os restantes elementos. Bom jogo de texturas e de sabores de outono num final leve e fresco, no entanto, senti que lhe faltava algo mais para ser o final esperado para um menu tão bem executado.

petit fours

petit fours

O que faltava à sobremesa anterior chegou sobre a forma de petit fours, com uma ampla seleção de pequenos pecados, do torrão ao chocolate passando pelo tradicional macaron. Tudo executado com primor e delicadeza.

Sobre o serviço poderíamos escrever os altos laudos. A equipa comandada por Roberto Pennacchiotti foi exímia em todos os pontos, do acolhimento, ao cuidado com uma criança pequena que certamente não será o cliente mais frequente do restaurante, passando sobretudo pela descontração com que fizeram fluir todo o serviço. Muitas vezes sentimos que um serviço é demasiado forçado e que tenta demasiado os estereótipos Michelin, aqui tudo parece natural e inato. De realçar ainda mais o trabalho do sommelier Walter Maccia, que nos propôs ótimas escolhas, considerando que pedimos especificamente para que não fosse feito um pairing de 1 vinho para 1 prato. Num país cujo vinho é bandeira é sempre bom e saudável ver as harmonizações a viajar além fronteiras, sem restrições ou preconceitos.

Considerações Finais
Entrar num hotel como o Four Seasons Florença é sempre um momento especial, é entrar num mundo encantado onde todos são príncipes e princesas e o Il Palagio é a sala onde a hospitalidade se veste a preceito. A cozinha italiana de Paolo Lavezzini trouxe uma lufada de ar fresco a um certo classicismo típico deste tipo de espaços, desde logo pela combinação de texturas à escolha dos elementos frescos e vegetais que vão marcando presença em todo o menu, e que fazem desta nova era do restaurante, um marco de visita obrigatória a quem passa pela cidade. Se procuram um ambiente elegante, com serviço equiparável ou superior a restaurantes com mais estrelas e uma cozinha equilibrada e refrescante sem perder a inspiração e o conforto italiano, o Il Palagio deve entrar na vossa bucketlist de Florença.

Nós prometemos voltar!

Il Palagio
Preços a partir de 150€ (sem vinhos)
Four Seasons Florença
Borgo Pinti, 99 – Florença
 

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Trattoria Cammillo

É ponto comum que um pouco por todo lado, seja Nova Iorque, Lisboa ou Porto existem espaços que tentam arduamente recriar o espírito de um autêntico restaurante italiano. Muitas vezes estes espaços servem boa comida, nada contra, mas normalmente falham a tentativa de recriar o ambiente que se vive num verdadeiro restaurante italiano.

Em sua defesa diria que é impossível recriar e modernizar uma certa patina que torna os ristorantes e as trattorias das cidades italianas. Do cheiro à disposição das mesas, dos sabores aos mestres do serviço, que parecem ter nascido dentro de alguns espaços, passando, claro, aos clientes habituais que se tornam parte da história e vida do espaço.

Isto é o que sentimos a cada visita que fazemos ao Trattoria Cammillo. Aberto desde 1945, é, apesar do nome, um autêntico restaurante Toscano, localizado no bairro de Oltrano – literalmente, o outro lado do Arno – em Florença.

Na família há gerações, os comandos estão hoje na mão da neta do fundador, Chiara Masiero que se divide com paixão entre as mesas e os fogões. E se é de família que se fala nestes restaurantes, um dos melhores aspectos deste clássico Florentino, é a cada ano entrarmos e reconhecermos os rostos e as pessoas que por lá trabalham, mais velhos é certo, mas sempre com o mesmo sorriso, diversão e eficácia.

A carta mostra a essência da cozinha Toscana, num sem fim de pratos que apetecem provar, mudando consoante o mercado, a estação e, claro, a vontade de quem o comanda. Mas como em conjunto vencedor não se mexe, existem sempre pratos icónicos do restaurante que vão perdurando no tempo.

Flores de courgette fritas

Flores de courgette fritas

Na mesa aguardam-nos os aborrecidos grissini de pacote aos quais se juntou rapidamente  um bom azeite de produção própria e o pão toscano (infelizmente sempre sem sal).  Escolhas feitas, surgem rapidamente na mesa umas lindíssimas Flores de courgette fritas – sem recheio, sem excesso de óleo e uma polme fina que rivaliza com as melhores tempuras japonesas. Uma entrada viciante à qual se juntou um não menos interessante e aditivo Prosciutto toscano.

Prosciutto toscano

Ravioli de Peixe, açafrão
Seguindo uma sugestão do dia, começamos com uns  raviolis de peixe branco com um leve e fragrante molho de açafrão. Sabor delicado, textura irrepreensível e nota alta para o primeiro prato de pasta.


Tagliatelle, nata, prosciutto e ervilhas
Parece um prato meio americano meio de cozinha caseira, mas o certo é que é um dos ícones do Cammillo, onde estranhamente tudo bate certo: do ponto de cozedura da pasta fresca à untuosidade do molho, a doçura e o salgado.  É pedido obrigatório!


Papperdelle com ragù de pombo
Obrigatório, quando há, é também este ragù de pombo a envolver um pappardelle fresco. Rico, confortável e repleto de sabor. Pura finesse gastronómica.


Costeleta de Vitela à Milanesa
Um habitué da cozinha italiana com uma costeleta fina e bem frita, tenra e suculenta, bem acompanhada pela frescura da rúcula e do tomate.

Scallopine de vitela ao Marsala, batatas fritas
Outro habitué das cartas italianas, o scallopine são bifes de vitela finos e tenros preparados, neste caso, com ótimo molho de vinho Marsala. A acompanhar, estiveram umas secas, estaladiças e saborosas chips de batata.


Tiramisù
Tiramisù delicado, de creme repleto de sabor a marcar bem a qualidade do mascarpone, sem excessos de doçura ou café. Muito bom!

Bebeu-se um Riecine Chianti Clássico de 2021, elegante, muito preciso na fruta e delicado no palato funcionando muito bem com a refeição.

Sobre o serviço não há muito mais a dizer – profissional, informal, conhecedor e apaixonado pelo ofício, algo raro nos dias de hoje…

Considerações Finais
Não é à toa que é considerado uma instituição da cidade, e que nas suas mesas encontramos uma mistura de clientes locais, quase diários, e turistas informados. Uma visita ao Cammilo é uma viagem pela simplicidade (nem sempre simples) e pelo sabor da cozinha toscana mais autêntica, que nos conforta e nos faz sentir em casa como aqueles sítios que visitamos há anos, onde nos fazem vontades e tratamos a equipa por tu. Por isso sim, se querem um local despretensioso e verdadeiro o Camilo será o vosso porto de abrigo em Florença – É o nosso há vários anos e fomos sempre felizes!

Trattoria Cammillo
Borgo S. Jacopo, 57/r, 50125 – Florença
+39 055 212 427

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Osteria delle tre panche

Depois de um bem sucedido restaurante na menos turística via Pacinoti, e de uma passagem por New York para um pop up, Andrea e Vieri, os dois apaixonados por trás da Osteria delle tre panche, decidiram que era hora de abrir um segundo restaurante.

Para isso nada melhor que o centro histórico de Florença, mais ainda quando a localização é um 5ºpiso em cima da Ponte Vecchio e com vista para o Duomo. A qualidade da comida já tinham garantido no seu primeiro espaço, agora estava também garantida a localização e o ambiente.

A vista da nossa mesa

O restaurante ocupa um piso e o rooftop do clássico hotel Hermitage, dispondo de uma sala clássica, dominada pela madeira e o feeling de um velho club inglês, repleto de patine e identidade. Mas o seu segredo é mesmo o rooftop, com uma vista de quase 360º num ambiente intimista e informal, onde tivemos a felicidade de almoçar.

O Osteria delle tre Panche sempre foi reconhecido pelo seu trabalho com trufas, pelo que em plena estação da trufa branca não poderíamos deixar de seguir as sugestões com este produto tão singular.

Polenta Frita, ragù de lebre
Começamos bem, com uma polenta bem crocante no exterior mas de interior húmido, coberta com ragù de lebre, cozinhado por várias horas a fogo lento, criando nuances de sabor bem distintas de um ragù comum. É sempre uma agradável surpresa descobrir os vários “molhos” que os toscanos vão criando a partir das várias carnes de caça.

Foie gras de Chianti, tostas e mostardas
De foie apenas o nome, o que servem é mesmo o clássico pâté toscano à base de fígado de aves, aqui preparado de forma exímia. Textura e sabor irrepreensíveis, especialmente quando provado com algumas das “mostardas” que o acompanhavam.

Com este prato bebeu-se Livio Felluga Sharis, um branco de Friuli que combina elegância e complexidade através do blend de Chardonnay com a casta nativa Ribolla Gialla. Um vinho que acompanhou particularmente bem o prato de fígado.

Tagliolini e Trufa Branca
Num restaurante reconhecido pelas suas propostas à base de trufa e estando nós em pleno pico da trufa branca, não poderíamos deixar de abraçar esses mesmos pratos. Começamos com um tagliolini bem preparado com manteiga e, claro, o inolvidável aroma da Trufa que nos estimula todos os sentidos.  Foi o prato perfeito para uma primeira refeição em Itália!

A harmonizar esteve um Girolamo de Castelo di Bossi, um 100% merlot cujo estágio prolongado lhe deu nuances e delicadeza capazes de acompanhar o prato.

Tártaro de Vaca, gema de ovo e trufa branca
Um clássico ao estilo italiano, em que a carne leva menos complementos que na versão francesa, mas onde se destaca obviamente o sabor da carne e o aroma sempre espetacular da trufa. Um pouco mais de sal e teria subido uns patamares de sabor.

Ao copo chegou um mais robusto Corbaia, também ele do produtor Castello di Bossi, aqui sim com um blend mais tradicional de Sangiovese e Cabernet Sauvignon. Um Super Toscano de corpo firme e equilibrado cujas notas de fruta vermelha madura e a acidez funcionaram bem com o prato.

Não deixamos espaço para a sobremesa, mas reza a lenda que o seu cheesecake é apreciado e louvado além fronteiras.

O serviço decorreu de forma diligente, com simplicidade mas sempre assertivo, principalmente no acompanhamento e serviço feito pela sua sommelier.

Considerações Finais
A Osteria delle tre panche é já um clássico bem instituído da cidade, visitado por locais e turistas em busca dos autênticos sabores toscanos. O espaço no centro histórico combina uma localização idílica com uma decoração sóbria e intemporal que servirá todos os gostos sem qualquer problema, especialmente aqueles que, como nós, tenham o privilégio de ficarem voltados para a obra-prima de Brunelleschi. Se procuram um restaurante tipicamente Florentino, e se em particular têm interesse em descobrir e provar pratos à base de trufa, então este poderá ser um espaço para vocês. Nós voltávamos hoje!

 

Preços a partir de 45€ (sem vinhos)
Roof Hotel Hermitage | Vicolo Marzio, 1 – Florença

Fotos: Flavors & Senses
Textos: João Oliveira
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Hotel Arts Barcelona

Na nossa última viagem a Barcelona escolhemos aquele que viria a transformar-se num dos nossos hotéis favoritos na cidade – o Hotel Arts Barcelona.

A caminhada em direção ao hotel é, por si só, uma experiência marcada pelo deslumbramento. O seu imponente exterior de aço e vidro destaca-se no horizonte da cidade, proporcionando uma visão única. O hotel tem uma conjugação perfeita – é um hotel de praia luxuoso e ao mesmo tempo consegue ser um destino sofisticado no centro da cidade.

Construído a partir de 1991 para os Jogos Olímpicos de ’92, o Hotel Arts Barcelona tornou-se famoso pela sua arquitetura única, que redefiniu completamente a paisagem ao seu redor. É uma combinação perfeita de design contemporâneo e luxo tradicional, com 44 andares projetados pelo renomado estúdio de arquitetura Skidmore Owings Merrill, sob a direção deBruce Graham.

O edifico só começo a funcionar como Hotel Arts Barcelona sob a sigla Ritz-Carlton a partir de 1994, e desde aí faz verdadeiramente jus ao nome, o hotel é verdadeiramente uma galeria de arte por si só! Destaca-se a icónica escultura aquática El Peix, projetada por Frank Gehry, uma das mais notáveis entre as mais de 500 peças de arte distribuídas pelo hotel, tendo inclusive colaborações com galerias de arte que usam peças contemporâneas especialmente selecionadas só para o espaço.

Esta foi a nossa primeira viagem com a Francisca, tinha ela 7 meses. Não posso dizer que a escolha do hotel tenha recaído sobre esse facto, mas a verdade é que a localização e o conforto do hotel melhoraram significativamente a experiência de viajar com uma bebé tão pequena e exigente.

Quartos
Com quartos a proporcionar vistas deslumbrantes sobre a cidade e o Mediterrâneo, a nossa Suite Executiva não foi excepção. Decorada com um design mais neutro, que vai ao encontro do padrão habitual dos hotéis com cunho Ritz-Carlton, com móveis discretos, uma cama grande e uma decoração simples mas bastante elegante

Restaurantes
Outro dos hightlights do Arts Barcelona é a panóplia de restaurantes e bares.

Contam-se sete restaurantes e bares dentro do Arts Barcelona, formando uma experiência culinária diversificada, desde cocktails no cosmopolita P41 Bar & Coctelarium até ao prestigiado Enoteca Paco Pérez, com duas estrelas Michelin.

Uma cuidada e ampla seleção de pequeno almoço

Uma cuidada e ampla seleção de pequeno almoço

Pelo meio temos o aclamado Roka, de cozinha japonesa, aberto apenas no verão, o Marina Coastal Food de cozinha mediterrânea, o The Pantry com o seu ambiente mais intimista para um fim de tarde ou jantar mais leve, o Bites, o local ideal para um snack ao longo do dia, um vinho a meia da tarde ou apenas uma reunião de trabalho e o Lokal que nos presenteia com a primeira refeição do dia.

Serviços
Aqui devemos ressalvar uma versatilidade notável, sendo um dos elementos chave do Arts Barcelona – o 43 The Spa. Uma espécie de refúgio que quase nos permite tocar as nuvens.

Uma espécie de duplex situado no topo do hotel com várias zonas de relaxamento, salas de massagem, turco, piscina e sauna com, provavelmente, uma das melhores vistas do mundo!

Um único senão que não compreendo – o spa não tem acesso gratuito a hóspedes. E não falo de realizar algum tipo de terapia, que obviamente teria que ser paga, falo de usufruir apenas das instalações e do circuito de água. Compreendo a necessidade de marcação, para garantir uma maior privacidade e momento de ócio, não consigo compreender o facto de hóspedes terem que pagar para usufruir das instalações.

Voltando aos serviços do Arts Barcelona. Além dos belos jardins onde nos podemos perder, o hotel conta com duas piscinas, uma exterior mais orientada para famílias e uma piscina infinita apenas para adultos, excelente regra, que permite a quem viaja sem crianças usufruir de momentos de relaxamento.

No que a áreas de bem-estar diz respeito, o hotel conta ainda com ginásio perfeitamente completo para o mais exigente dos atletas.

Para quem viaja a trabalho e decide ficar num dos melhores hotéis da cidade, saiba que o Arts Barcelona conta com 14 salas para eventos como conferências, reuniões ou palestras, assim como um salão de festas que consegue acomodar mais de 1000 convidados.

De salientar que cada sala pode ser perfeitamente personalizável de acordo com o evento em si.

Para quem usa a exclusividade como mote das suas viagens, o hotel tem o Club Floor e o Executive Club Lounge, uma espécie de item básico habitual do Ritz-Carlton. Um pequeno paraíso para os hóspedes Premium, com check-in privativo e refeições gratuitas ao longo do dia.

Uma primeira viagem fantástica com a “fera”

Concluindo, eu diria que o Hotel Arts Barcelona tem a simbiose perfeita entre o mar, a cidade e a arte. E que volvidos 30 anos, não só acompanhou as mudanças, como soube reinventar-se para se manter como um dos mais imperdíveis hotéis da cidade.

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Mont Bar

 

Será este o momento da democratização das estrelas Michelin? Podemos ir a um espaço estrelado e beber um copo de vinho e comer um prato ou alguns snacks? Poderá um bar receber uma estrela? Foi certamente isso que passou pela cabeça de Ivan Castro, o proprietário do Mont Bar quando receberam o convite para a gala de 2023. E sim, um pequeno wine bar de esquina em Barcelona ganhou a sua 1ª estrela!

Mas voltemos mais atrás para perceber o fenómeno! Há cerca de 10 anos Ivan, depois de um percurso familiar ligado à hotelaria, decide abrir um pequeno bar, decorado com bom gosto , numa combinação de Bistrot elegante e wine bar, que servi-se tapas diferenciadas dos demais. O sucesso foi grande, a esquina da Carrer de la Diputació com Aribau tornou-se pequena e quis o destino que na porta ao lado, Ivan e a sua esposa abrissem o – ainda mais informal – Mediamanga. No entanto e ao contrário de tantas histórias que todos conhecemos, a malograda pandemia trouxe ao Mont Bar a cereja no topo do bolo. Com o encerramento de todo o projecto el Barri de Albert Adrià, Fran Agudo – até então chef do Tickets juntou-se a Ivan e Kasaundra para reformular e inovar ainda mais o que se fazia por ali.

A ideia sempre foi a de criar um espaço informal, com uma cozinha séria, de produto e com muitas nuances de vanguarda, onde sobressaíssem os snacks e os pequenos pratos de partilha, e foi isso mesmo que nos levou até lá para um almoço ligeiro antes de um voo de regresso a casa.

Começamos com um Albariño escolhido entre as mais de 250 referências do espaço, e um amuse bouche à base de salsa e cogumelos que deixava antever que a cozinha de vanguarda seria o mote dos snacks que se seguiriam. Com isto rapidamente percebemos que também no serviço começaram logo por mostrar que não estávamos num qualquer bar de esquina catalão, considerando o rigor e o conhecimento que demonstravam e nos levava para outros ambientes.

Amuse bouche – Salsa e Cogumelos

Soufflé de Berbigão
A quase já clássica Air Baguette de Adrià recheada com espuma de hondashi, endro e berbigões de alta qualidade abertos no ponto. Um delicioso contraste de texturas e sabor a mar com nuances de frescura.

Um início ímpar ao que se seguiu um Tártaro de Wagyu com pão de chipotle, onde se destaca a textura untuosidade da carne bem contrastante com a base arejada, crocante e levemente picante do chipotle.  Lula, Pele de frango 
Se até aqui o nível ia bom, aqui subiu a outro patamar – o molusco com uma textura sedosa e suave como se encontra apenas nos melhores espaço de sushi, em contraste com a pele crocante e bem seca levam-nos num jogo sabor e textura único. Um grande, grande snack!

Bikini de camarão e pézinhos de porco
No momento seguinte a cozinha de vanguarda dá as mãos à cozinha de conforto dos bares que aqui homenageiam. Porco e camarão – um casamento famoso na cozinha asiática, que aqui ganha forma como uma fina sanduíche de recheio gelatinoso e exterior crocante com os pequenos camarões a ficarem bem tostados. Para comer em dose dupla!

Ventresca de Atum, molho de pinhão
Entrando nos “pratos principais” a irresistível ventresca de atum marinada em teriyaki com molho de pinhões e notas levemente fumadas, a acompanhar fatias de bom pão. Produto de ótima qualidade, trabalhado com precisão e respeito, num prato que não apetece parar de comer.  Canelone de Frango, cantarelos e. foie gras
O prato mais conservador é também ele o mais profundo em sabor, com notas de outono bem casadas e técnicas que são tudo menos simples. A começar logo pela massa fresca, o frango ainda húmido e suculento, o molho rico de foie gras e o ótimo demi-glace. De limpar a última mancha com a côdea do pão!

Twister de Lavanda
Finalizamos com um regresso à infância e aos gelados da Olá (ou neste caso da Frigo) numa versão de alta cozinha, levemente aromatizado com lavanda, boa textura e sabor delicado, perfeito para um final leve como se pretendia.

Houve ainda tempo para uns petit fours preparados com elegância e savoir fair

Nos vinhos optamos por seguir toda a refeição com Albariño de 2020 1583 de Fefiñanes de aromas expressivos com algumas notas especiadas e fruta de caroço, com a boca a revelar uma ótima frescura e uma estrutura capaz, fruto do seu curto estágio em madeira.

Como referi anteriormente o serviço decorreu de forma irrepreensível, deixando antever que o sonho de democratizar a alta gastronomia há muito que fazia parte das intenções de Ivan. Certo que hoje, depois da estrela, os preços aumentaram ligeiramente e o menu de degustação surgiu quase por obrigação, mas continua a ser possível escolher à carta, e deixar-se levar por alguns snacks ou um, ou outro, prato bem hidratados com vinho a copo como na génese do restaurante.

Considerações Finais
Este pode muito bem ser o restaurante de fine dining para pessoas que odeiam fine dining. Do ambiente relaxado de bistrot à cozinha de produto, técnica mas irrepreensível. Aqui não encontramos a imposição de um chef ou a rigidez institucional da maioria dos restaurantes do segmento, é aquele restaurante elegante que poderia muito bem ser o bar de todos os dias, onde podemos divagar entre mesa, balcão ou o bulício da esplanada se estivermos nesse mood, a carteira é que claro irá sofrer as consequências de uma cozinha e um serviço de primeira linha.

Se voltaria? Já amanhã e de preferência sem um avião para apanhar de forma a poder mergulhar a fundo em todo o seu menu.

Mont Bar – Barcelona
Preços a partir de 60€ (sem vinhos)
Carrer de la Diputació, 220  – Barcelona

English Version

Fotos: Flavors & Senses

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Estimar Barcelona

Estimar, valorizar e respeitar, pode muito bem ser o mote de qualquer restaurante de produto – daqueles que realmente se focam no produto e não aqueles que apenas gostam de o anunciar, normalmente repletos de desfaçatez… Adiante!

Entre esses templos do produto, é ainda mais raro ver a assinatura de um chef entrelaçar-se com essa cozinha desnuda, sem adereços e focada em sobressair o melhor de cada ingrediente, como no caso do Estimar e de Rafa Zafra. Aberto em 2016 em Barcelona, numa localização que teria provavelmente tudo para dar errado, Rafa levou o seu extenso currículo (entre passagens pelos melhores restaurantes de Espanha e Itália, o chef sevilhano estará para sempre ligado aos irmãos Adrià, com os quais chefiou a Hacienda Benazuza no El Bulli Hotel e o Heart em Ibiza) para uma cozinha 100% focada no mar.

Com ingredientes únicos em mãos, fruto da ligação à família Gotanegra que há 5 gerações comercializa peixe e marisco no porto de Roses, a assinatura de Rafa passou sobretudo por combinações ousadas que despertam nos comensais uma avidez e um desejo difícil de explicar  – basta lembrar o seu célebre ouriço com gamba e caviar.

Entrando no restaurante entramos num pequeno mundo à parte, ambiente totalmente informal, mesas despidas e quase sobrepostas, com a sala a ser simultaneamente balcão e cozinha, permitindo-nos entrar num espetáculo bem montado de cozinha e serviço.

Na mesa somos rapidamente brindados com o couvert, Biqueirão marginado, azeitonas bom pão e champagne no copo.

couvert

A Gilda 3.0 do Estimar é uma elevação do clássico basco, acompanhada do pão com tomate bem catalão. Anchova, percebe, guindilla, alho, pimento e azeitona, num pequeno espeto repleto de dimensões e nuances de sabor, que nos mostram logo à partida que não estamos numa qualquer marisqueira.

Seguiu-se uma das assinaturas de Rafa, uma torrada, com manteiga fumada e um dos seus fetiches, caviar, diz-se aliás que será por ventura o chef a vender mais caviar em todo o mundo, muito por culpa do seu Jondal em Ibiza.  Deliciosas notas de fumo e gordura refrescadas por um mergulho no mar. Podia facilmente comer uma dúzia.. ou duas!

Continuamos com mais um mergulho salino com umas ostras francesas de porte singular, servidas com pompa e circunstância, finalizadas com um toque de chalota em mignonette.

Ouriço, Gamba e Caviar
Este prato é uma das mais singulares assinaturas de Rafa Zafra, e um dos motivos da nossa visita, pelo que felizmente estava disponível. Para quem gosta de sabores marinhos e naturais é impossível resistir a esta bomba de mar, textura e equilíbrio de salinidade e doçura. Facilmente a minha última refeição!

Anémona-do-mar
Aqui vemos mais uma vez a técnica ao serviço de um produto raro e pouco valorizado (pelo menos entre nós). Aqui as anémonas foram fritas de forma irrepreensível, criando pontas crocantes e um interior repleto de sabor e rugosidade.

Lagostim
Um lagostim de mais de 500gr, ligeiramente cozinhado no josper apenas até ao seu corpo deixar de ser completamente translúcido. Jugoso, doce e único, numa homenagem superior ao produto que nos foi colocado à frente. Para os portugueses seria claramente um lagostim cru, mas a verdade é que precisamos mesmo de mudar a forma como apreciamos produtos tão nobres e com tanto para nos entregar.

Gamba Roja de Roses
O Marisco que Rafa utiliza e homenageia com mais frequência são estas gambas rojas de Roses. Poderiam ser de qualquer outro porto, Dénia, Huelva, Palamós, Garrucha… que o dito cujo não tem fronteiras. A diferença está sobretudo nos barcos e na forma como são tratados e cuidados desde o momento da pesca até ao momento da entrega final. Quanto ao sabor não há muito a dizer, é o meu crustáceo favorito, de corpo doce e uma intensidade de sabor na cabeça à qual é difícil resistir. Aqui foram ligeiramente cozinhadas no josper e servidas de imediato.

Rodovalho
Não entrando na habitual guerra de rodovalho/pregado que tanto vivemos no nosso país, aqui comemos rodovalho, ao que os nossos vizinhos chamam de rémol. O peixe a que chamam rodaballo é na realidade o nosso pregado. Um peixe de pequeno porte, perfeito para dois comensais depois de uma já longa refeição. Grelhado rigorosamente no Josper, espinhado e regado com uma salsa bilbaina, mais rica do que a normalmente encontramos pelo país basco.

A acompanhar estava uma singular salada de tomate, com diferentes variedades e que facilmente conquista os mais cépticos.

Tarte de Queijo, marmelada de morango
As sobremesas são outro dos capítulos importantes do Estimar, criadas por Francisco Zafra, irmão do chef e atual chef executivo do Estimar Barcelona. Infelizmente não havia capacidade para mais, pelo que escolhemos apenas uma (todas têm um tamanho considerável, pelo que dão bem para 2 pessoas) e, assim sendo, a escolha acaba sempre numa tarte de queijo, quando há. Cremosa como ditam as tendências mas de sabor mais cítrico e fresco que o habitual. Um belíssimo final!

O serviço decorreu de forma diligente e a bom tempo, especialmente cuidando que havia uma pequena criança entre nós. Nota alta para as explicações de cada produto e as sugestões da carta, enquanto no copo nunca faltou o Bollinger, marcado a um preço correto e que envergonharia qualquer restaurante português.

Considerações Finais
Passar as portas de vigias do Estimar é entrar num mundo especial desenhado Rafa, Anna e Ricardo.Um mundo de sabor, serviço, informalidade, respeito e paixão, muito respeito e paixão, por produtos únicos, criteriosamente selecionados e cuja qualidade é cada vez mais difícil de encontrar pelos comuns mortais. Uma cozinha sem a “ficção científica” que seria o meio mais simples para Rafa Zafra se movimentar, mas sim despida de tudo menos de sabor e precisão técnica. Uma refeição inesquecível para qualquer amante dos sabores do mar, repleta de momentos altos e finalizada da melhor forma.

Só me resta contar os dias para voltar. Este Estimar é claramente um dos imperdíveis!

Estimar – Barcelona
Preços a partir de 100€ (sem vinhos)
Carrer de Sant Antoni dels Sombrerers, 3 – Barcelona

English Version

Fotos: Flavors & Senses

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