Rota das Estrelas: Casa de Chá da Boa Nova

 Há artigos que pecam por tardios, mas a cerca de um mês do anúncio das estrelas para 2018, e uma vez que este ano anda tudo muito sossegado quanto aos nomes que conseguirão manter ou conquistar as suas estrelas (os fenómenos dos media são mesmo assim), estamos perante uma boa altura para falar daqueles que normalmente mais brilham, ou seja, os chefs!

E para isso nada como um jantar da Rota das Estrelas, onde 4 dos mais bem sucedidos chefs em Portugal se reuniram para um jantar com o Mar como pano de fundo.

A batuta coube a Rui Paula, o anfitrião que recebeu na sua Casa de Chá da Boa Nova, Hans Neuner (Ocean, **Michelin), Miguel Rocha Vieira (Fortaleza do Guincho, Costes, Costes Downtown, *Michelin), Rui Silvestre (Bon Bon, *Michelin), que é como quem diz, uma cambada de tipos com pedigree.

Um irresistível Presunto Ibérico com corte afinado

A festa começou no exterior, com o sol a mostrar-se envergonhado à boa moda do Porto, mas com champanhe Pommery em quantidades suficientes para nos transportar para melhores climas. Não faltou um impecável Presunto ibérico bem laminado pelo Vítor Oliveira da Academia de Corte, salmão fumado artesanal feito pela equipa do Boa Nova, que se revelou uma bela surpresa.

 Salmão fumado artesanal

E continuamos com os snacks de Verão do Boa Nova, que já conhecíamos de outras visitas e uma colorida selecção de pães, com variedades e ingredientes para todos os gostos.

“Macarron” de algas e sardinha

António Lopes (Wine Guru, Anantara Vilamoura) foi o escanção convidado para se juntar a Carlos Monteiro

Durante a azáfama de ordenar todos os convidados nas suas respetivas mesas, não se dá pelo passar do tempo, enquanto vamos apreciando todos os encantos da Casa de Chá da Boa Nova e do seu enquadramento perfeito que, mesmo com mau tempo, nos transmite sensações únicas (é de facto uma sala única e especial).

A bom ritmo, surge no copo um Cattier “Clos du Moulin” Rosé, o champanhe que viria a fazer um excelente casamento com o prato que se seguiria, com as suas notas de frutos vermelhos e verbena.

Rui Paula – Caranguejo Real, Tomate e Morango
Um prato leve, fresco e aparentemente simples. Grande rigor na execução dos frutos, tomates e emulsões, mas para um início perfeito teria de ter sido o Caranguejo real a brilhar, o que acabou por não acontecer, pelo excesso de “picado” e da secura da carne.

Hans Neuner – Ostra, Foie gras fumado e ananás dos Açores
Este prato trouxe-me memórias duma grande refeição do Ocean, onde este prato tinha brilhado entre os restantes momentos. Não estando naturalmente ao mesmo nível, que a versão apresentada no Ocean (por todos os motivos e mais alguns), parecendo-me aqui que o ananás se sobrepôs um pouco aos demais ingredientes. Ainda assim uma entrada irresistível!

No copo o casamento revelou-se a bom nível, com a cremosidade da bolha e o final fresco do Billecart Salmon  Blanc Des Blancs.

Rui Silvestre – Lavagante do Atlântico, gema de ovo e caviar imperial
Existem pratos que por ingredientes mais nobres que tenham e por melhor que seja a técnica executada, não nos entusiasmam. Faltou-lhe a alma (e possivelmente um caldo) para o levar a outros voos.

A acompanhar o prato a escolha recaiu sobre o Principal Rosé de 2010, um vinho que foi controverso à mesa, com alguns comensais a considerar que já tinha perdido o seu fulgor e a sua energia, mas que a mim me deu gosto beber e que combinou bem com o lado mais gordo do prato.

Rui Paula – Homenagem aos Pescadores
A inspiração veio de uma Chora (sopa tradicional do receituário dos nossos pescadores), aqui presente no molho e na espuma que dão vida ao prato, onde as texturas e os peixes confeccionados no ponto criaram a simbiose perfeita e fizeram deste o prato da noite. Muito bom!

A acompanhar, não poderiam ter feito melhor escolha, com um dos meus vinhos preferidos da região dos Vinhos Verdes, o Ameal “Escolha” 2015, um grande ano, em que este exemplar 100% Loureiro se mostra em grande esplendor, com frescura e muita complexidade.

Miguel Rocha Vieira – Cherne de Anzol, alcachofras e lula dos Açores
Gosto da forma como o chef Miguel Rocha Vieira normalmente pensa os seus pratos de peixe e a forma como lhe adiciona contrastes fortes de sabor a terra, seja pela beterraba, a cenoura ou neste caso a alcachofra.  Tecnicamente irrepreensível no aspecto, teve algumas falhas na cocção do peixe – é um daqueles casos em que se o prato fosse preparado na sua cozinha e pela sua equipa durante um serviço normal, nos faria aplaudir.

Ainda assim foi um excelente momento à mesa, mais ainda quando conjugado com Niepoort VV de 2015, o grande branco que Dirk Niepoort criou na Bairrada a partir de uma combinação de Maria Gomes e Bical.

Rui Paula – milho e molho do assado
É impressionante a evolução da cozinha de Rui Paula nos últimos anos, lembro-me de há menos de uma década servir o seu cabrito assado, o seu pastelão com bife do Lombo, que depois evoluiu para pratos como o peixe galo com risotto de lima e que nos últimos tempos tem apresentado combinações de texturas e platings arriscados. A evolução é isso mesmo, aprender, criar e executar, e no caso de Rui Paula, é visível que tem aprendido a tirar elementos dos pratos e a fazer brilhar aqueles com que efetivamente decide trabalhar.

Apresentando aqui um bom jogo de texturas em torno do milho, com puré, maçaroca, milho baby, blini e a pipoca (dispensável), sabores adocicados, afinados pelas algas e o molho do assado, que apesar da pouca quantidade, fez maravilhas ao conjunto.

E se até aqui a escolha vínica ia em alta, este momento não seria excepção, com o impressionante Quinta da Pellada Primus 2015 a ser servido. É ainda muito jovem para ser totalmente apreciado, mas é um vinho que impressiona, seja pela mineralidade, a acidez ou a sua frescura e longevidade na boca. Um grande vinho!

Pré-Sobremesa

Pausa no jantar, onde não houve pratos de carne, e onde não fizeram falta, e eis que surge a pré-sobremesa, bem trabalhada pela equipa de Rui Paula, com sabores quentes e ricos, do chocolate, figo e cereja. Muito bom.

Rui Paula – Avelã, cereais e pão tostado
Um prato que já tinha provado e aprovado numa visita anterior ao Boa Nova (ver). Uma combinação que nos transporta para o pequeno almoço, com os seus sabores e ingredientes de conforto muito bem trabalhados.

Ainda assim e depois de uma refeição tão longa, não seria pior se o final fosse um pouco mais leve e fresco (que é sempre a minha opção para sobremesas em menus).

Para terminar não houve um mas sim dois vinhos, um Porto Dalva Colheita de 2007 e um Madeira Barbeito “Bual” de 1995. Ambos em excelente forma, mas com o Madeira a conquistar-me para o último gole. Que grandes vinhos está a fazer o Ricardo Diogo e a sua equipa.

E por falar em vinho, não posso deixar de destacar o trabalho do Carlos Monteiro e do António Lopes, quer pela seleção de grandes vinhos com que nos presentearam quer pela forma como souberam harmonizá-los com os pratos servidos.

Considerações Finais
Eventos como o Rota das estrelas não deve ser vistos como “extraordinários momentos gastronómicos”, isto porque, sem dúvida, cada chef brilha muito mais na sua própria cozinha, no seu habitat e com a sua equipa. Devem ser vistos como grandes festas, festas gastronómicas, onde num jantar apenas se conseguem reunir 4 ou 5 nomes que dificilmente se voltam a juntar e provar pratos que de outra forma nos fariam viajar por todo o país (não que comer não seja o principal motivo para eu viajar!).

Sobre este jantar, resta-me dar os parabéns a todos os chefs e em especial ao anfitrião, Rui Paula, que recebeu cozinheiros e comensais no seu cenário inigualável e com o seu habitual savoir faire.

Um brinde aos chefs e às novas estrelas que estão quase aí a chegar!

English Version

Fotos: Flavors & Senses 

Rota das Estrelas

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